1. INTRODUÇÃO
1.1. Preâmbulo
1.2. Antecedentes
1.3. Abordagem de Risco em Obstetrícia
1.4. Definição de Parto Normal
1.5. Objetivo da Assistência ao Parto Normal, Tarefas do Prestador de Serviços
1.6. O Prestador de Serviços no Parto Normal
2. ASPECTOS GERAIS DA ASSISTÊNCIA AO PARTO
2.1. Avaliação
2.2. Procedimentos de Rotina
2.3. Nutrição
2.4. Local de Parto
2.5. Apoio durante o Parto
2.6. Dor Durante o trabalho de Parto
2.6.1. Métodos não farmacológicos de alívio da dor
2.6.2. Alívio da Dor durante o trabalho de parto por meios farmacológicos
2.7. Monitoramento Fetal Durante o Trabalho de Parto
2.7.1. Avaliação do Líquido Amniótico
2.7.2. Monitoramento da Freqüência Cardíaca Fetal
2.7.3. Exame do sangue do escalpo fetal
2.7.4. Comparação entre a ausculta e o monitoramento eletrônico fetal
2.8. Higiene
3. ASSISTÊNCIA DURANTE O PRIMEIRO ESTÁGIO DO PARTO
3.1. Avaliação do Início do Trabalho de Parto
3.2. Posição e Movimento durante o Primeiro Estágio do trabalho de parto
3.3. Exame Vaginal
3.4. Monitoramento da Progressão do Trabalho de Parto
3.5. Prevenção do Trabalho de Parto Prolongado
3.5.1. Amniotomia Precoce
3.5.2. Infusão Intravenosa de Ocitocina
3.5.3. Administração Intramuscular de ocitocina
4. ASSISTÊNCIA DURANTE O SEGUNDO ESTÁGIO DO PARTO
4.1. Antecedentes Fisiológicos
4.2. Início do Segundo Estágio
4.3. Início do Puxo durante o Segundo Estágio
4.4. Procedimento do Puxo durante o Segundo Estágio
4.5. Duração do Segundo Estágio
4.6. Posição Materna durante o Segundo Estágio
4.7. Cuidados com o Períneo
4.7.1. Proteção do Períneo Durante o Parto
4.7.2. Laceração de períneo e episiotomia
5. ASSISTÊNCIA DURANTE O TERCEIRO ESTÁGIO DO PARTO
5.1. Antecendentes
5.2. Uso Profilático de Ocitócitos
5.3. Tração Controlada do Cordão
5.4. Comparação entre os Manejos Ativo e Expectante do terceiro Estágio
5.5. Momento para o Clampeamento do Cordão
5.6. Cuidados Imediatos do Recém-Nascido
5.7. Cuidados da Mãe Imediatamente Após a Dequitação da Placenta
6. CLASSIFICAÇÃO DE PRÁTICAS NO PARTO NORMAL
6.1. Práticas que são Demonstradamente Úteis e que Devem ser Estimuladas
6.2. Práticas Claramente Prejudiciais ou Ineficazes e que devem ser Eliminadas
6.3. Práticas em Relação às quais Não Existem Evidências Suficientes para Apoiar uma Recomendação Clara e que devem Ser Utilizadas com Cautela até que Mais Pesquisas Esclareçam a Questão
6.4. Práticas Freqüentemente Utilizadas de Modo Inadequado
7. REFERÊNCIAS

1. INTRODUÇÃO

1.1.Preâmbulo

Apesar de muitos anos de consideráveis debates e pesquisas, o conceito de “normalidade” no parto não é padronizado ou universal. Nas últimas décadas, vimos uma rápida expansão no desenvolvimento e uso de uma variedade de práticas desenhadas para iniciar, corrigir a dinâmica, acelerar, regular ou monitorar o processo fisiológico do parto, com o objetivo de obter melhores resultados de mães e recém-nascidos, e algumas vezes para racionalizar padrões de trabalho, no caso do parto hospitalar. Em países desenvolvidos onde essas atividades se generalizaram, questiona-se cada vez mais se esses altos níveis de intervenção são valiosos ou desejáveis. Ao mesmo tempo, os países em desenvolvimento estão procurando fazer com que todas as mulheres tenham acesso a uma assistência obstétrica segura, a um preço a seu alcance. A adoção sem críticas de uma variedade de intervenções inúteis, inoportunas, inadequadas e/ou desnecessárias, com muita freqüência mal avaliadas, é um risco incorrido por muitas pessoas que tentam melhorar os serviços obstétricos. Depois de estabelecer uma definição de trabalho de “parto normal”, este documento identifica as práticas mais comuns utilizadas durante o trabalho de parto e tenta estabelecer algumas normas de boas práticas para a conduta do trabalho de parto sem complicações.

O relatório aborda questões de assistência ao parto normal, independentemente do seu local ou nível de assistência. Suas recomendações sobre as intervenções que são ou deveriam ser utilizadas para apoiar os processos do parto normal não são específicas para um país ou região. Existem enormes variações em todo o mundo em relação ao local e nível de assistência, a sofisticação dos serviços disponíveis e ao tipo de prestador de serviços no parto normal. O objetivo deste relatório é simplesmente examinar as evidências pró ou contra algumas das práticas mais comuns e fazer recomendações, fundamentadas nas melhores evidências disponíveis, quanto ao seu papel na assistência ao parto normal. Em 1985, uma reunião da região européia da Organização Mundial da Saúde (OMS), e da Organização Pan-Americana de Saúde – Escritório Regional para as Américas, em Fortaleza, Brasil, fez uma série de recomendações baseadas numa variedade similar de práticas (OMS 1985). Apesar disso, e apesar da ênfase rapidamente crescente na medicina baseada em evidências, muitas dessas práticas continuam a ser comuns, sem considerar devidamente seu valor para as mulheres ou seus filhos. Esta é a primeira vez em que uma reunião envolvendo peritos em obstetrícia de todas as regiões da OMS teve a oportunidade de esclarecer, à luz dos conhecimentos atuais, qual é, em sua opinião, o papel de tais práticas na assistência ao parto normal.

Após discutir as evidências, o grupo de trabalho classificou suas recomendações sobre as práticas relacionadas ao parto normal em quatro categorias:

A- Práticas demonstradamente úteis e que devem ser estimuladas
B- Práticas claramente prejudiciais ou ineficazes e que devem ser eliminadas
C- Práticas em relação às quais não existem evidências suficientes para apoiar uma recomendação clara e que devem ser utilizadas com cautela, até que mais pesquisas esclareçam a questão
D- Práticas freqüentemente utilizadas de modo inadequado.

1.2. Antecedentes

A primeira questão a ser esclarecida é o significado com que este documento emprega a expressão “parto normal” (veja a seção 1.4, a seguir). É crucial ser específico, a fim de evitar erros de interpretação. Uma frase freqüentemente citada conclui que “só é possível dizer que um , parto é normal retrospectivamente”. Esta noção muito difundida fez com que obstetras em muitos países concluíssem que a assistência durante o parto normal deveria ser similar à assistência ao parto complicado. Este conceito apresenta várias desvantagens: o potencial para transformar um evento fisiológico normal num procedimento médico; a interferência com a liberdade da mulher de viver a experiência do nascimento de seus filhos à sua própria maneira, no local de sua escolha; a indução de intervenções desnecessárias; e, devido à necessidade de economias de escala, sua aplicação requer uma concentração de grande número de parturiente em hospitais tecnicamente bem equipados, com os custos decorrentes. Com o fenômeno global de crescente urbanização, muito mais mulheres estão dando à luz em maternidades, quer tenham partos normais ou complicados. Existe uma tentação para tratar todos os partos rotineiramente com o mesmo alto grau de intervenção exigido por aqueles que apresentam complicações. Infelizmente, isto tem uma ampla variedade de efeitos negativos, alguns com implicações sérias. Variam do simples custo em tempo, treinamento e equipamentos exigido por muitos dos métodos utilizados ao fato que muitas mulheres podem não procurar a assistência de que necessitam devido a preocupações sobre o alto nível de intervenção. As mulheres e seus bebês podem ser prejudicados em conseqüência de práticas desnecessárias. O funcionamento do pessoal de serviços de referência pode diminuir de qualidade, caso sua capacidade de atender mulheres com patologias sérias, que necessitam de toda a sua atenção e experiência, for assoberbada pelo grande número de partos normais que recebem. Por sua vez, o manejo desses partos normais freqüentemente obedece a “protocolos padrão”, que somente se justificam na assistência a mulheres com complicações de parto. Este relatório não é um apelo em favor de nenhum local particular para o parto, pois reconhece a realidade de uma variedade de locais adequados, desde o domicílio até o centro de referência terciário, dependendo da disponibilidade e da necessidade. Procura simplesmente em que consiste uma boa assistência ao parto normal, onde quer que ele ocorra. O ponto de partida para o resultado seguro de qualquer parto, a avaliação do risco, requer um estudo individual especial, mas, antes de discutir os componentes da assistência obstétrica, deve-se fazer uma breve introdução desse conceito.

1.3. Abordagem de Risco em Obstetrícia

Uma avaliação das necessidades e daquilo que poderia ser chamado “potencial de parto” constitui a base de uma boa tomada de decisão em relação ao parto, o início de toda boa assistência. Aquilo que é conhecido como “abordagem de risco” vem há décadas dominando as decisões sobre o parto, seu local, seu tipo e qual o prestador de serviços envolvido (Enkin 1994). O problema com muitos desses sistemas é que eles fizeram com que um número desproporcionadamente alto de mulheres fosse classificado como “de risco”, com o conseqüente risco de um alto nível de intervenção no parto. Outro problema é que, apesar de uma classificação escrupulosa, a abordagem de risco notadamente não consegue identificar muitas das mulheres que realmente precisarão de assistência para complicações de parto. Similarmente, muitas mulheres identificadas como “de alto risco” têm partos perfeitamente normais, sem qualquer problema. Mesmo assim, alguma forma de avaliação inicial e continuada da probabilidade que uma mulher tenha um parto normal é crucial para evitar e/ou identificar o início de complicações e as decisões que devem ser tomadas sobre o fornecimento de uma assistência adequada.

Assim, este relatório tem início com a questão da avaliação da parturiente. A avaliação dos fatores de risco e o pré-natal, e pode ser feita de um modo relativamente simples, determinando-se a idade, altura e paridade da mãe, indagando sobre complicações na sua história obstétrica, como cesarianas ou mortes fetais anteriores, e investigando a presença de anormalidades na gravidez atual, como pré-eclâmpsia, gestação múltipla, hemorragia posição anormal ou anemia severa (De Groot et ai 1993). A avaliação de risco também pode diferenciar de modo mais extenso fatores de risco e nível de assistência individuais (Nasah 1994) Nos Países Baixos, elaborou-se uma lista de indicações médicas para a assistência especializada diferenciando baixo, médio e alto risco (Treffers 1993). Em muitos países e instituições onde se faz uma distinção entre gestações de alto e de baixo risco, utilizam-se listas do mesmo tipo. A eficácia de um escore de risco é medida por sua capacidade de discriminar entre mulheres de alto e de baixo risco, ou seja, por sua sensibilidade, especificidade, e valores preditivos positivo e negativo (Rooney 1992). É difícil obter números exatos sobre o desempenho, discriminatório desses escores de risco, porém, com base nas informações disponíveis, podemos concluir que é possível fazer uma distinção razoável entre gestações de alto e baixo risco, em países desenvolvidos e em desenvolvimento (Van Alten et ai 1989, De Groot et al 1993). A definição do risco obstétrico por fatores demográficos, como paridade e altura materna, tem baixa especificidade e portanto faz com que muitos partos não complicados sejam rotulados como de alto risco. A especificidade de complicações na história obstétrica ou na gestação atual e muito maior. Entretanto, mesmo uma assistência pré-natal e uma avaliação de risco de alta qualidade não podem substituir uma vigilância adequada da mãe e do feto durante o trabalho de parto.

A avaliação de risco não é uma medida a ser utilizada uma única vez, mas um procedimento continuado ao longo da gestação e do trabalho de parto. A qualquer momento complicações precoces podem tornar-se aparentes, induzindo a decisão de encaminhar a mãe a um nível mais complexo de assistência.

Durante o pré-natal, deve-se fazer um planejamento, com base nessa avaliação de risco identificando o local do parto, e o tipo de profissional que deverá estar envolvido. Este planejamento deve ser feito em conjunto com a gestante, e comunicado a seu marido ou companheiro. Em muitos países também é aconselhável que a família tenha conhecimento dele, porque pode ser a instância de tomada de decisões importantes. Em sociedades que respeitam o sigilo, as regras são outras: a família somente pode ser informada pela própria paciente. O plano deve estar disponível no início do trabalho de parto. Neste momento, faz-se uma reavaliação de risco incluindo um exame físico para avaliar o estado da mãe e do feto, a posição e apresentação deste último e os sinais de trabalho de parto existentes. Se não foi feito um pré-natal, a avaliação de risco deve ser feita por ocasião do primeiro contato com os prestadores de serviço, durante o trabalho de parto. O trabalho de parto de baixo risco tem início entre 37 e 42 semanas completas. Se nenhum fator de risco for identificado, o trabalho de parto pode ser considerado de baixo risco.

1.4. Definição de Parto Normal

Na definição de parto normal, dois fatores devem ser considerados: o risco da gestação e evolução do trabalho de parto. Como já foi discutido, o valor preditivo de escores de risco está longe de ser 100%- uma gestante de baixo risco no início do trabalho de parto pode vir a ter complicações. Por outro lado, muitas gestantes de alto risco ao final têm uma evolução sem complicações. O foco primário deste documento é o grande grupo de gestações de baixo risco.

Definimos parto normal como de início espontâneo, baixo risco no início do trabalho de parto, permanecendo assim durante todo o processo, até o nascimento. O bebê nasce espontaneamente, em posição cefálica de vértice, entre 37 e 42 semanas completas de gestação. Após o nascimento, mãe e filho em boas condições.

Entretanto, como o trabalho de parto e o parto de muitas gestantes de alto risco têm um curso normal, várias recomendações deste documento também se aplicam à assistência dessas mulheres.

Quantos nascimentos, de acordo com essa definição, podem ser considerados normais? Isto dependerá em grande parte das taxas regionais e locais de avaliação de risco e de encaminhamento. Estudos sobre “assistência alternativa ao parto” em países desenvolvidos mostram uma taxa média de 20 de encaminhamentos durante o trabalho de parto, e a mesma proporção de encaminhamentos no decorrer da gestação. Em multíparas, as taxas de encaminhamento são muito menores do que em nulíparas (MacVicar et al 1993, Hundley et al 1994, Waldenstrôm et al 1996). Nesses estudos, a avaliação de risco geralmente é muito meticulosa, o que leva ao encaminhamento de muitas mulheres que, posteriormente, têm um trabalho de parto normal. Noutras circunstâncias, o número de encaminhamentos pode ser mais baixo. No Quênia, verificou-se que 84,8% de todos os trabalhos de parto não apresentavam complicações (Mati et al 1983). Em geral, entre 70 e 80% de todas as gestantes podem ser consideradas de baixo risco no início do trabalho de parto.

1.5. Objetivo da Assistência ao Parto Normal, Tarefas do Prestador de Serviços

O objetivo da assistência é ter uma mãe e uma criança saudáveis, com o menor nível possível de intervenção compatível com a segurança. Esta abordagem implica em:

No parto normal, deve existir uma razão válida para interferir no processo natural.

As tarefas do prestador de serviços* são quatro:

–Dar apoio à mulher, ao seu parceiro e à sua família durante o trabalho de parto, no momento do nascimento e no pós-parto.
–Observar a parturiente; monitorar o estado fetal e posteriormente o do recém-nascido; avaliar os fatores de risco; detectar os problemas precocemente.
–Realizar intervenções, como amniotomia e episiotomia, se necessário; prestar os cuidados ao recém-nascido após o nascimento,
–Encaminhar a parturiente a um nível de assistência mais complexo, caso surjam fatores de risco ou complicações que justifiquem.

Isto pressupõe um fácil encaminhamento a um nível mais complexo de assistência. Em 111 muitos países, isto não ocorre; neste caso, são necessárias regras especiais para permitir que os prestadores de assistência primária realizem as tarefas salvadoras necessárias. Isto implica treinamento adicional e adaptação da legislação vigente, dando respaldo aos prestadores de serviço que as executam. Também implica acordo entre os prestadores de serviços quanto a suas responsabilidades (Kwast 1992, Fathalla 1992).

O termo “prestador de serviços” refere-se ao profissional de saúde.

1.6. O Prestador de Serviços no Parto Normal

O prestador de serviços de parto, ou parteiro*, deve ser capaz de realizar as tarefas cima mencionadas. Deve ter um treinamento adequado e uma variedade de habilidades obstétricas apropriadas ao nível de assistência. Essas habilidades devem permitir, minimamente, que o prestador de serviços avalie fatores de risco, reconheça o início de complicações, execute observações maternas e monitore o estado do feto e do recém-nascido. O prestador de serviços deve ser capaz de executar intervenções básicas essenciais e de cuidar do recém-nascido após o seu nascimento. Deve ser capaz de encaminhar a mãe ou o recém-nascido a um nível mais complexo de assistência, caso surjam complicações que exijam intervenções acima de sua competência.Finalmente, e com igual importância, o prestador de serviços deve ter paciência e empatia necessárias para dar apoio à parturiente e à sua família. Quando possível, o prestador de serviços deve procurar fornecer a continuidade da assistência pré-natal, ao parto e no puerpério; se esta continuidade não puder ser pessoa, deve haver uma continuidade por meio da organização da assistência.Vários tipos de profissional podem ser considerados para executar essas tarefas:

–O ginecologista-obstetra: esses profissionais certamente são capazes de lidar com os aspectos técnicos das diferentes tarefas do prestador de serviço; espera-se que também tenham a empatia necessária. Em geral, os obstetras devem dedicar sua atenção a mulheres de alto risco e ao tratamento de complicações sérias. Normalmente são responsáveis por cirurgias obstétricas. Devido a seu treinamento e atitude profissional, podem ser mais propensos- na verdade, freqüentemente são forçados a isso pelas circunstâncias- a intervir mais freqüentemente do que enfermeiras-parteiras. Em muitos países, especialmente em desenvolvimento, o número de obstetras é limitado e sua distribuição é desigual, concentrando-se em cidades de maior porte. É pouco provável que suas responsabilidades pelo manejo de complicações importantes deixem-lhe muito tempo disponível para dar assistência e apoio à parturiente e à sua família durante todo o trabalho de parto normal.

–O generalista: o treinamento teórico e prático em obstetrícia deste profissional é muito variável. Certamente existem generalistas bem treinados que são capazes de realizar as tarefas do prestador de serviços de assistência obstétrica primária e, portanto, um parto normal. Entretanto, em gral, a obstetrícia é apenas uma pequena parte de seu treinamento e das suas responsabilidades quotidianas, e portanto é difícil manter seus conhecimentos e habilidades práticas atualizadas. Em países em desenvolvimento, os generalistas normalmente dedicam grande parte de seu tempo à obstetrícia, sendo portanto bastante experientes, mas dedicam mais atenção a patologias obstétricas do que a partos normais.

–A enfermeira-parteira: a definição internacional de enfermeira-parteira, segundo a OMS, a CIP (Confederação Internacional de Parteiras) e a FIGO (Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia) é bastante simples: se o programa de treinamento é reconhecido pelo governo que credencia a parteira a exercer suas atividades, aquela pessoa é uma parteira (Peters 1995). Geralmente essa pessoa é uma competente prestadora de serviços de obstetrícia, especialmente treinada para a assistência ao parto normal. Entretanto, existem grandes variações entre países em relação ao treinamento e tarefas das parteiras. Em muitos países industrializados, as parteiras trabalham em hospitais, sob a supervisão dos obstetras. Em geral isso significa que a assistência ao parto normal é parte da assistência de todo o departamento de obstetrícia, estando portanto sujeita às mesmas regras e condutas, com pouca distinção entre gestações de baixo e alto risco.
O efeito da definição internacional de enfermeira-parteira é o reconhecimento da existência de diferentes programas de treinamento de parteiras, incluindo a possibilidade de treinamento sem qualquer qualificação anterior em enfermagem, mais reconhecida como “entrada-direta”. Esta forma de treinamento existe em muitos países, e está tendo uma nova onda de popularidade, tanto por parte de governos quanto de candidatas a enfermeiras-parteiras (Radford e Thompson 1987). A entrada direta num programa de enfermeiras-parteiras que ofereça um treinamento abrangente em obstetrícia e assuntos conexos, como pediatria, planejamento familiar, epidemiologia, etc., foi reconhecida como sendo de melhor custo-efetividade por estar centrada nas necessidades das parturientes e seus bebês. Mais importante do que o tipo de preparação para a prática oferecida por qualquer governo é a competência e capacidade da parteira para agir de modo decidido e independente. Por essas razões, é vital assegurar que todos os programas de treinamento de enfermeiras-parteiras protejam e promovam a capacidade dessas profissionais de realizar a maioria dos partos, avaliar os risos e, quando a necessidade local o exigir, manejar complicações do parto à medida que forem surgindo (Kwast 1995b, Peters 1995, Treffers 1995). Em muitos países em desenvolvimento, as enfermeiras-parteiras atuam não apenas em hospitais como em centros de saúde e na comunidade, freqüentemente com pouca ou nenhuma supervisão.Em vários países, em muitas partes do mundo, tenta-se promover a ampliação do papel das enfermeiras-parteiras, incluindo treinamento para salvar vidas (Kwast 1992, O´Heir 1996).

–Pessoal auxiliar e parteiras leigas treinadas (PLs): em países em desenvolvimento onde existe uma escassez de pessoal de saúde bem treinado, a assistência em povoados e centros de saúde freqüentemente está a cargo de pessoal auxiliar, como auxiliares de enfermagem/parteiras, parteiras tradicionais ou parteiras leigas treinadas (Ibrahim 1992, Alisjahbana 1995). Em certas circunstâncias, isso pode ser inevitável. Estas pessoas receberam pelo menos algum grau de treinamento, e freqüentemente fornecem a maior parte dos serviços obstétricos na periferia. Utilizando seus serviços, especialmente se forem supervisionados por enfermeiras-parteiras bem treinadas, pode-se melhorar o resultado da gestação e do parto (Kwast 1992). Entretanto, com freqüência seu nível educacional é insuficiente para que executem todas as tarefas acima descritas do prestador de serviços, e seus antecedentes podem fazer com que sua prática seja condicionada por fortes normas culturais e tradicionais, que podem bloquear a eficácia de seu treinamento. Entretanto, deve-se reconhecer que é precisamente está identificação cultural que freqüentemente faz com que muitas mulheres, especialmente em áreas rurais, prefiram seus serviços no momento do parto (Okafor e Rizzuto 1994, Jaffre e Prual 1994).

Com base nesses dados, a enfermeira-parteira parece ser o tipo mais adequado e com melhor custo-efetividade de prestador de cuidados de saúde para ser responsável pela assistência a gestação e ao parto normais, incluindo a avaliação de riscos e o reconhecimento de complicações. Entre as recomendações aprovadas pela Assistência Geral do XIII Congresso Mundial da FIGO (Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia), realizado em Singapura em 1991 (FIGO 1991), encontram-se as seguintes:

–Para aumentar o acesso às mulheres com maior necessidade, cada função de assistência obstétrica deve ser realizada no nível mais periférico onde for viável e segura.

–Para utilizar os recursos humanos disponíveis do modo mais eficiente, cada função dos cuidados obstétricos deve ser realizada pelas pessoas menos treinadas capazes de fornecer tal assistência de modo seguro e eficaz.

–Em muitos países, caso se deseje fornecer uma assistência obstétrica eficaz, para e com a comunidade, é necessário um maior grau de apoio às enfermeiras-parteiras e assistentes de enfermagem/parteiras, lotadas em centros de saúde de pequeno porte.

Essas recomendações apontam a parteira como o provedor básico de cuidados de saúde na prestação de cuidados obstétricos em centros de saúde de pequeno porte, em pequenas comunidades e no domicílio, e talvez em hospitais (OMS 1994). As enfermeiras-parteiras são os provedores de cuidados primários de saúde mais apropriados para serem responsáveis pela assistência ao parto normal. Entretanto, e muitos países desenvolvidos e em desenvolvimento, não existem enfermeiras-parteiras ou elas somente podem ser encontradas em hospitais de grande porte, onde podem exercer funções de auxiliares dos obstetras.

Em 1992, foi publicado no Reino Unido o relatório sobre serviços obstétricos do Comitê de Saúde da Câmara dos Comuns. Entre outras coisas, recomendava que as enfermeiras-parteiras deveriam ter suas próprias clientes e total responsabilidade por elas; também deveriam ter a oportunidade de implementar unidades obstétricas onde realizassem os partos, dentro e fora do ambiente hospitalar (House of Commons 1992). A seguir foi publicado o relatório do Grupo de Peritos em Obstetrícia “Changing Childbirth” (Department of Health 1993), com recomendações semelhantes. Esses documentos são o primeiro passo para uma maior independência profissional das enfermeiras-parteiras na Grã-Bretanha. Em alguns países europeus, as enfermeiras-parteiras têm total responsabilidade pela assistência à gestação e ao parto normais, tanto no domicílio quanto no hospital; porém em muitos outros países europeus e nos EUA, quase todas as enfermeiras-parteiras (se existirem) trabalham em hospitais, supervisionadas por obstetras.

Em muitos países em desenvolvimento, a enfermeira-parteira é considerada a pessoa chave para o fornecimento de assistência obstétrica (Mati 1994, Chintu e Susu 1994). Entretanto, isto não ocorre em todos eles: alguns países enfrentam uma escassez de enfermeiras-parteiras. Especialmente na América Latina, escolas de parteiras têm sido fechadas, devido à suposição que suas tarefas seriam assumidas por médicos. Em alguns países o número de enfermeiras-parteiras está diminuindo, e as que existem estão mal distribuídas: a maioria trabalha em hospitais nas cidades, e não nas áreas rurais, onde está 80% da população e onde, e conseqüentemente, ocorre a maioria dos problemas (Kwast e Bentley 1991, Kwast 1995b). Recomenda-se o treinamento de enfermeiras-parteiras, e que se reflita sobre a localização das escolas de treinamento, para que sejam mais facilmente acessíveis a pessoas de áreas rurais, que têm maior probabilidade de permanecer em suas comunidades de origem. O treinamento deve possibilitar que as enfermeiras-parteiras satisfaçam as necessidades das comunidades a que irão servir. Devem ser capazes de identificar complicações que exigem encaminhamento, mas, se o encaminhamento a um nível mais complexo de assistência for difícil, devem ser capazes de realizar intervenções salvadoras.

O termo “parteiro” identifica aquele que assiste ao parto, independente da formação.

2. ASPECTOS GERAIS DA ASSISTÊNCIA AO PARTO

2.1.Avaliação

Quando o trabalho de parto inicia-se espontaneamente, em geral as próprias mulheres dão início à assistência, ou mandando chamar a pessoa que irá realizar o parto ou tomando providências para admissão a um serviço de saúde. A responsabilidade do prestador de serviços de avaliar qual a assistência mais adequada no início do trabalho de parto já foi abordada, e a importância do apoio ao longo do trabalho de parto é discutida a seguir. Qualquer que seja o local do parto, é vital estabelecer uma boa relação entre a mulher e o seu prestador de serviços, tenham eles se encontrado anteriormente ou não . A qualidade do acolhimento a uma mulher que procura uma assistência institucional pode determinar o nível de confiança que ela e sua família sentem que podem ter em relação aos seus prestadores de serviço.

Durante todo o trabalho de parto, deve-se avaliar regularmente o bem-estar físico e emocional da mulher. Isto implica medir a temperatura, freqüência cardíaca e pressão arterial, verificar a ingesta de líquidos e o débito urinário, avaliar o grau de dor e a necessidade de apoio. Este monitoramento deve ser continuado até o final do processo de parto.

A avaliação do bem-estar da mulher também inclui a atenção à sua privacidade durante o trabalho de parto, respeitando sua escolha de acompanhantes e evitando a presença de pessoas não necessárias na sala de parto.

2.2. Procedimentos de Rotina

No momento de internação num hospital ou centro de saúde, a preparação para o parto freqüentemente inclui vários procedimentos “de rotina”, como medir a temperatura, freqüência cardíaca e pressão arterial, e administrar um enema, seguido pela tricotomia total ou parcial dos pêlos pubianos.

Os primeiros três procedimentos, medição e registro da temperatura, freqüência cardíaca e pressão arterial, podem ter implicações sobre o resultado final do parto, e portanto poderia influenciar o seu manejo. Esses procedimentos de rotina não devem ser eliminados, mas devem ser apresentados e explicados à parturiente e ao seu parceiro. A verificação da temperatura a cada 4 horas, de acordo com o partograma da OMS, é importante, porque um aumento de temperatura pode ser um sinal precoce de infecção, e portanto pode levar ao tratamento precoce, especialmente no caso de trabalho de parto prolongado com membranas rotas; isto pode evitar a sépsis. Ocasionalmente, a elevação de temperatura pode ser um sinal de desidratação.

A verificação da pressão arterial nos mesmos intervalos é um item importante para aferir o bem-estar materno. Um aumento súbito na pressão arterial pode indicar a necessidade de apressar o parto ou transferir a parturiente para um nível mais complexo de assistência.

Os enemas ainda são largamente utilizados porque supostamente estimulam as contrações uterinas e porque um intestino vazio facilita a descida da cabeça. Acredita-se também que reduzem a contaminação e, portanto, a infecção da mãe e do bebê. Entretanto, são incômodos e apresentam um certo risco de lesão intestinal. Embora algumas mulheres peçam um enema, muitas outras consideram-nos constrangedores. Dois estudos randomizados controlados (Romney e Gordon 1981 Drayton e Rees 1984) verificaram que, com o uso de enemas, a taxa de eliminação involuntária de pequena quantidade de fozes não se altera durante o primeiro estágio, mas diminui durante o nascimento. Sem um enema, a maioria dos casos desta eliminação de fezes é leve e mais fácil de limpar do que a que ocorre após um enema. Não foram detectados efeitos sobre a duração do trabalho ou sobre infecção neonatal ou infecção da incisão de episiotomia.

Presume-se que a tricotomia (Johnston e Sidall 1922, Kantor et al 1965) reduza a infecção e facilite a sutura, mas não existem evidências em favor dessa suposição As mulheres sentem desconforto quando os pêlos começam a crescer, e o risco de infecção não diminui. O uso rotineiro pode inclusive aumentar o risco de infecção pêlos vírus do HIV e da hepatite tanto para o parteiro quanto para a parturiente.

Em conclusão, a verificação da temperatura, freqüência cardíaca e pressão arterial é uma observação e não uma intervenção, e faz parte da avaliação contínua durante o trabalho de parto. Tem um papel claro na assistência, pois podem indicar a necessidade de alterar o curso de ação num determinado parto. Entretanto, só são possíveis em algumas situações. Os últimos dois procedimentos-enema e tricotomia- há muito tem são considerados desnecessários, e somente devem ser realizados a pedido da mulher. Não existe documentação, e muito menos estudos sobre esses procedimentos de rotina no caso de partos domiciliares. Também não existem evidencias que a sua necessidade no domicílio seja diferente da necessidade no hospital.

2.3.Nutrição

As opiniões sobre a nutrição durante o parto variam amplamente em todo o mundo. Em muitos países desenvolvidos, o receio de aspiração do conteúdo gástrico durante a anestesia geral (síndrome de Mendelson) continua a justificar a regra de abstenção total de alimentos ou líquidos durante o trabalho de parto. Para a maioria das parturientes, a suspensão de alimentos não constitui problema pois de qualquer modo não desejam comer durante o trabalho de parto, embora muitas sintam uma necessidade desesperada de líquidos. Em muitos países em desenvolvimento, crenças tradicionais ligadas à cultura restringem a ingesta de alimentos e líquidos.

O temor quanto ao risco de aspiração do conteúdo gástrico é real e sério. Entretanto restringir a ingesta de líquidos e alimentos durante o trabalho de parto não garante um menor conteúdo estomacal (Crawford 1956, Taylor e Pryse-Davies 1966, Roberts e Shirey 1976, Tettambel 1983, Mckay e Mahan 1988). Vários estudos sobre métodos para reduzir o conteúdo gástrico ou sua acidez, tanto por meios farmacológicos quanto pela restrição da ingesta ora não conseguiram estabelecer um efeito 100% positivo de nenhum método específico. Encontrou-se uma grande variação de valores de pH e, portanto, conforme a conclusão de uma investigação a administração rotineira de antiácidos durante o trabalho de parto não é um modo confiável para evitar a síndrome de Mendelson, nem afeta o volume do conteúdo gástrico.

O risco de aspiração está associado ao risco de anestesia geral. Como não há garantias contra a síndrome de Mendelson, a abordagem correta ao parto normal deve incluir uma avaliação do risco de anestesia geral. Uma vez classificado como de baixo risco, o parto pode ser manejado sem a administração de antiácidos.

O trabalho de parto requer enormes quantidades de energia. Como não se pode prever a sua duração, é preciso repor as fontes de energia, a fim de garantir o bem-estar fetal e materno. A restrição severa de ingesta oral pode levar à desidratação e à cetose. Esta situação é comumente tratada por uma infusão intravenosa de soluções contendo glicose. Os efeitos desse tratamento sobre a parturiente foram avaliados em vários estudos randomizados (Lucas et al 1980, Rutter et al 1980, Tarnow-Mordi et al 1981, Lawrence et al 1982). O aumento nos níveis médios de glicemia parece estar acompanhado de um aumento nos níveis maternos de insulina (e por uma redução dos níveis médios de 3-hidroxibutirato). Também resulta num aumento de níveis plasmáticos de glicose no bebê, e pode resultar numa diminuição do pH do sangue da artéria umbilical. Quando a parturiente recebe mais de 25 gramas de glicose por via intravenosa durante o trabalho de parto pode haver hiperinsulinismo fetal, o que pode resultar em hipoglicemia neonatal e elevação dos níveis sanguíneos de lactato. O uso excessivo de soluções intravenosas sem sódio pode levar à hiponatremia tanto materna quanto no recém-nascido.

As complicações acima mencionadas, especialmente a desidratação e a cetose, podem ser evitadas pela oferta de líquidos por via oral durante o trabalho de parto, e pela oferta de alimentos leves. As infusões intravenosas de rotina interferem com o processo natural e restringem a liberdade de movimentos da mulher. Mesmo a inserção profilática rotineira de uma cânula intravenosa é um convite a intervenções desnecessárias.

Na situação de parto domiciliar, não é oferecido nenhum tratamento específico: nenhum uso de antiácidos, nenhuma restrição líquida ou de ingesta alimentar. Algumas vezes, diz-se às mulheres que comer e beber durante o trabalho de parto pode causar náuseas, mas, como estão na sua própria casa, não há nenhum controle sobre o tipo de ingesta. Quando as parturientes querem comer, tendem a ingerir alimentos leves, facilmente digeríveis. Intuitivamente, não ingerem comidas e bebidas pesadas. É seguro dizer que, no caso de um parto normal de baixo risco, em qualquer local, não há necessidade de restrição alimentar. Entretanto, é preciso haver um debate sério para determinar se os efeitos da intervenção na nutrição materna durante o trabalho de parto não são piores do que os riscos de síndrome de Mendelson. E ainda há muitas dúvidas , tais como: Existe alguma pesquisa sobre trabalho de parto com um estômago cheio? Existe alguma diferença entre comer e beber um pouquinho ou nada? Existem dados sobre os efeitos da restrição alimentar e hídrica durante o trabalho de parto em países em desenvolvimento, onde não existem meios de substituir a perda de energia durante o trabalho de parto prolongado?

Em conclusão, a nutrição é um assunto ao mesmo tempo muito importante e muito variável. A abordagem correta parece ser não interferir com o desejo da parturiente de comer e beber durante o trabalho de parto, uma vez que, no parto normal, deve haver uma razão válida para interferir com o processo natural. Entretanto, existem tantos receios e rotinas difíceis de mudar, em todo mundo, que cada um deles deve ser tratado de modo diferente.

2.4. Local de Parto

O local tem um impacto sobre o andamento do trabalho de parto e o nascimento? Nas duas últimas décadas, foram feitos muitos estudos sobre esse ponto (Campbell e Macfarlane 1994). Quando, em muitos países em desenvolvimento, o parto passou de um processo natural a um procedimento controlado, o local de nascimento mudou do domicílio para o hospital. Ao mesmo tempo, grande parte do calor humano foi eliminada. A dor passou a ser aliviada por meios farmacológicos e as mulheres ficavam sozinhas por longos períodos, pois, de qualquer modo, estavam num sono leve; eram monitoradas, de longe. Este foi o outro extremo do espectro em relação àquelas regiões onde menos de 20% das mulheres têm acesso a qualquer tipo de maternidade formal. Para elas, o parto domiciliar não é uma escolha, mas sim virtualmente inevitável, por razões que variam de econômicas a culturais, incluindo as geográficas (Mbizvo et al 1993, Onwudiego 1993, Smith 1993). A proposta de um retorno ao processo natural, em muitas partes do mundo desenvolvido, abriu as salas de parto aos pais e outros familiares, mas o local permaneceu o mesmo: o hospital. Alguns hospitais esforçaram-se, implementando salas de parto mais semelhantes ao ambiente doméstico, e observou-se que isso aumentava a satisfação materna e diminuía a taxa de traumatismo de períneo, bem como reduzia o desejo de outro tipo de ambiente no próximo parto, mas estudos randomizados não encontraram nenhum efeito sobre o uso de analgesia epidural, uso de fórceps e cesáreas (Klein et al 1984, Chapman et al 1986). Esses estudos envolveram primariamente um ambiente mais atraente de sala de parto, sem uma alteração fundamental no atendimento; aparentemente, isto não é suficiente para melhorar a qualidade da assistência e o resultado obstétrico.

Outros estudos revelaram que uma mulher com um parto de baixo risco dando à luz seu primeiro filho num hospital de ensino poderia ser atendida por até 16 pessoas durante 6 horas de parto, e ainda assim ficar sozinha durante a maior parte do tempo (Hodnett e Osborn 1989b). Os procedimentos rotineiros, mas não familiares, a presença de estranhos e o isolamento durante o trabalho de parto e/ou parto causaram estresse, e o estresse pode interferir no andamento do parto, prolongando-o e desencadeando o que foi descrito como uma “cascata de intervenção”.

A distribuição do parto domiciliar no mundo é desigual. Com a institucionalização disseminada do parto desde a década de 30, a possibilidade de parto domiciliar desapareceu na maioria dos países desenvolvidos, mesmo onde ele não foi proibido. O sistema de assistência obstétrica dos Países Baixos, onde mais de 30% das gestantes ainda dão à luz em casa, é excepcional entre países desenvolvidos (Van Alten et al 1989, Treffers et al 1990). Por outro lado, em muitos países em desenvolvimento, grandes distâncias entre mulheres e as instituições de saúde restringem as opções e fazem com que o parto domiciliar seja a única escolha.

Embora prestadores de serviço treinados possam realizar adequadamente a avaliação de riscos, nem sempre sua recomendação sobre o local do parto, feita com base nessa avaliação, é seguida. Muitos fatores afastam as mulheres de instituições de saúde de um nível mais alto, incluindo o custo de um parto hospitalar, práticas não familiares, atitudes inadequadas dos funcionários, restrições quanto à presença de familiares no parto e freqüentemente a necessidade de obter permissão de outros familiares (em geral do sexo masculino) antes de procurar a assistência institucional (Brieger et al 1994, Paolisso e Leslie 1995). Freqüentemente, mulheres de alto e muito alto risco não se sentem doentes ou apresentam sinais de patologia, de modo que dão à luz em casa, com o auxílio de um familiar, um vizinho ou uma parteira leiga (Kwast 1995).

Entretanto, um parto domiciliar adequadamente atendido exige alguns preparativos essenciais. O parteiro deve assegurar-se da disponibilidade de água limpa, e que o local em que ocorrerá o nascimento deve estar aquecida. É preciso lavar as mãos cuidadosamente. Panos ou toalhas quentes devem estar prontos para embrulhar o bebê e mantê-lo aquecido. Também deve haver pelo menos alguma forma de um kit de parto, conforme a recomendação da OMS, a fim criar campo mais limpo possível para o nascimento e para tratar adequadamente o cordão umbilical. Além disso, deve haver disponibilidade de transporte para um centro de referência, se necessário. Em termos práticos, isto significa a necessidade de participação da comunidade e fundos rotatórios, a fim de permitir arranjos de transporte em caso de emergências, em áreas onde o transporte é um problema.

Em alguns países desenvolvidos, criaram-se centros de parto, em hospitais ou fora deles, onde mulheres de baixo risco podem dar à luz numa atmosfera semelhante à domiciliar, com assistência obstétrica primária, em geral aos cuidados de enfermeiras -parteiras. A maioria desses centros, não utiliza o monitoramento fetal eletrônico e a correção da dinâmica/aceleração do trabalho de parto, e o uso de analgésicos é mínimo. Um relatório extenso sobre a assistência em centros de parto nos Estados Unidos descreveu os cuidados em centros alternativos de parto em hospitais e fora deles (Rooks et al 1989). Experiências com atendimento feito por enfermeiras-parteiras em hospitais na Grã-Bretanha, Austrália e Suécia mostrou que a satisfação das mulheres com esse tipo de cuidados era muito maior do que com a assistência padrão. O número de intervenções era geralmente menor, especialmente a analgesia obstétrica, indução e correção da dinâmica do trabalho de parto. Os resultados obstétricos não foram significativamente diferentes em relação à assistência fornecida por especialistas, embora em alguns estudos houvesse uma tendência para uma mortalidade perinatal levemente maior nos modelos de assistência realizada por enfermeiras-parteiras (Flint et al 1989, MacVicar et al 1993, Waldenstrôm e Niisson 1993, Hundley et al 1994, Rowley et al 1995, Waldenstrôm et al 1996).

Em vários países desenvolvidos, a insatisfação com a assistência hospitalar levou pequenos grupos de mulheres e prestadores de serviços à prática do parto domiciliar num ambiente alternativo, freqüentemente em confronto mais ou menos velado com o sistema oficial de assistência. Existem poucos dados estatísticos sobre esses partos domiciliares. Num estudo na Austrália, os dados coletados sugeriram um êxito apenas moderado da seleção de gestações de baixo risco. Em partos domiciliares programados, o número de encaminhamentos para um hospital e a taxa de intervenção obstétrica eram baixos. A mortalidade perinatal e a morbidade neonatal também eram relativamente baixas, mas os dados sobre fatores preveníveis não foram fornecidos (Bastian e Lancaster 1992).

Os Países Baixos são um país desenvolvido com um sistema oficial de parto domiciliar.

A incidência de partos domiciliares difere consideravelmente entre regiões, e mesmo entre cidades de grande porte. Um estudo de mortalidade perinatal não mostrou nenhuma correlação entre partos hospitalares e mortalidade perinatal por região (Treffers e Laan 1986). Um estudo realizado na província de Gelderland comparou o “resultado obstétrico” de partos domiciliares e hospitalares. Os resultados sugeriram que, no caso de primíparas com uma gestação de baixo risco, um parto domiciliar era tão seguro quanto um parto hospitalar. No caso de multíparas de baixo risco, o resultado de um parto domiciliar era significativamente melhor do que o de um parto hospitalar (Wiegers et al 1996). Não há evidências que esse sistema de assistência à gestante possa ser melhorado por meio de uma maior medicalização do parto (Buitendijk 1993).

No Nepal, a abordagem de descentralização da assistência obstétrica foi adaptada às necessidades especiais das áreas urbanas de um país em desenvolvimento, onde a capacidade de um hospital de fornecer os serviços obstétricos especializados necessários para mulheres com complicações de parto estava sendo sobrepujada pelo número de mulheres de baixo risco com partos normais – uma situação freqüente em muitos países em desenvolvimento. O desenvolvimento de uma unidade de parto “de baixa tecnologia” nas proximidades do principal hospital não apenas diminuiu a pressão sobre a unidade especializada como facilitou muito o fornecimento de uma assistência apropriada a mulheres com parto normal. Um projeto semelhante, em maior escala, foi realizado em Lusaka, Zâmbia, onde um hospital universitário, que funcionava como centro de referência especializado para todo o país, estava superlotado por grandes números de gestantes de baixo risco. O aumento da capacidade dos centros de parto periféricos e a abertura de novos centros para partos de baixo risco reduziram o número de partos neste hospital de cerca de 22.000 para cerca de 12.000, enquanto o número total de partos nos doze ambulatórios satélite subiu de um pouco mais de 2.000 em 1982 para 15.298 em 1988. A assistência às gestantes de alto risco no hospital melhorou, pela diminuição do número de gestantes de baixo risco, enquanto as unidades periféricas dispunham de tempo suficiente para assegurar que as gestantes de baixo risco recebiam atenção a assistência e atenção de que necessitavam (Nasah e Tyndall 1994).

Assim, em que lugar uma mulher deve dar à luz? Pode-se afirmar com segurança que uma mulher deve dar à luz num local onde se sinta segura, e no nível mais periférico onde a assistência adequada for viável e segura (FIGO 1992). No caso de uma gestante de baixo risco, este local pode ser a sua casa, uma maternidade ou centro de parto de pequeno porte numa cidade, ou talvez a maternidade de um hospital de maior porte. Entretanto, deve ser um local onde toda a atenção e cuidados estejam concentrados em suas necessidades e segurança, o mais perto possível de sua casa e de sua própria cultura. Se o parto ocorrer no domicílio ou num centro de parto periférico pequeno, as providências pré-natais devem incluir planos de contingência para acesso a um centro de referência com uma equipe adequada.

2.5. Apoio durante o Parto

Relatos e estudos controlados randomizados sobre o apoio por uma única pessoa durante o parto, uma “doula”, parteira ou enfermeira, mostraram que o apoio físico e empático continuo durante o trabalho de parto apresentava muitos benefícios, incluindo um trabalho de parto mais curto, um volume significativamente menor de medicações e analgesia epidural, menos escores de Apgar abaixo de 7 e menos partos operatórios (Klaus et al 1986, Hodnett e Osbom 1989, Hemminki et al 1990, Hofmeyr et al 1991).

Este documento identifica uma “doula” como uma prestadora de serviços que recebeu um treinamento básico sobre parto e que está familiarizada com uma ampla variedade de procedimentos de assistência. Fornece apoio emocional, consistindo de elogios, reafirmação medidas para aumentar o conforto materno, contato físico, como friccionar as costas da parturiente e ,segurar suas mãos, explicações sobre o que está acontecendo durante o trabalho de parto e uma presença amiga constante. Tais tarefas também podem ser realizadas por uma enfermeira ou parteira mas freqüentemente estas devem executar procedimentos técnico/médicos que podem distrair sua atenção da mãe. Entretanto, o apoio reconfortante constante de uma pessoa envolvida diminui significativamente a ansiedade e a sensação de ter tido um parto difícil numa avaliação feita por puérperas 24 horas após o parto. Também teve um efeito positivo sobre o número de mulheres que continuavam a amamentar 6 semanas após o parto.

Uma parturiente deve ser acompanhada pelas pessoas em quem confia e com quem se sinta a vontade: seu parceiro, sua melhor amiga, uma doula ou uma enfermeira-parteira Em alguns países em desenvolvimento, esta lista também poderia incluir a parteira leiga. Em geral, serão pessoas que conheceu durante sua gestação. Os profissionais que prestam assistência obstétrica devem estar familiarizados tanto com suas tarefas médicas quanto com as de apoio, e ser capazes de realizar ambas com competência e delicadeza. Uma das tarefas de apoio do prestador de serviços é dar a mulher todas as informações e explicações que esta deseje e necessite. A privacidade da mulher no ambiente de parto deve ser respeitada. Uma parturiente necessita seu próprio quarto, onde o número de prestadores de serviço deve ser limitado ao mínimo essencial.

Entretanto, na vida real com freqüência as circunstâncias são consideravelmente diferentes situação ideal acima descrita. Em países desenvolvidos, muitas vezes as parturientes sentem-se isoladas nas salas de parto de grandes hospitais, cercadas por equipamento técnico e sem um apoio amigo por parte dos prestadores de serviços. Em países em desenvolvimento, alguns hospitais de grande porte estão tão assoberbados por partos de baixo risco que é impossível fornecer apoio pessoal e privacidade. Os partos domiciliares em países em desenvolvimento freqüentemente são atendidos por pessoal sem treinamento ou com treinamento insuficiente. Nessas circunstâncias, o apoio à parturiente é deficiente ou mesmo ausente, pois um número significativo de mulheres dá à luz sem nenhum tipo de parteiro.

Em conclusão, o parto norAs implicações dessas declarações em relação ao local do parto e ao fornecimento de apoio podem ser muito grandes, porque elas sugerem que os prestadores de assistência obstétrica devem trabalhar numa escala muito mais reduzida. Deve-se fornecer assistência especializada na comunidade onde a mulher mora ou local próximo, em vez de concentrar todas as parturientes numa grande unidade obstétrica. Unidades de grande porte que realizam 50 a 60 partos por dia deveriam reestruturar seus serviços a fim de poderem responder às necessidades das parturientes. Os prestadores de serviços precisariam reorganizar os turnos de trabalho a fim de satisfazer as necessidades de continuidade de assistência e apoio das parturientes. Isto também tem implicações de custo, e portanto torna-se uma questão política. Tanto países desenvolvidos quanto em desenvolvimento devem abordar e resolver essas questões, cada um de seu modo.mal, desde que de baixo risco, necessita apenas observação cuidadosa por um parteiro treinado e competente, a fim de detectar sinais precoces de complicações. Não necessita intervenção, e sim estímulo, apoio e carinho. Podem-se elaborar diretrizes gerais sobre o que é necessário para proteger e estimular o parto normal. Entretanto, cada país disposto a investir nesses serviços deve adaptar essas diretrizes à sua situação específica e às necessidades das parturientes, assim como assegurar a presença dos elementos básicos, a fim de atender adequadamente as gestantes de baixo, médio e alto risco e aquelas que desenvolverem complicações.

2.6. Dor Durante o trabalho de Parto

Quase todas as mulheres sentem dor durante o trabalho de parto, mas as respostas de cada. uma delas a esta dor são amplamente diferentes. Segundo a experiência clínica, o trabalho de parto anormal, prolongado ou distócico, induzido ou acelerado por ocitócitos, ou terminado por instrumentação parece ser mais doloroso do que o “parto normal”. Mesmo assim, até um trabalho de parto completamente normal também é doloroso.

2.6.1. Métodos não farmacológicos de alívio da dor

Uma tarefa importante do parteiro é ajudar as mulheres a suportar a dor durante o trabalho de parto. Isto pode ser obtido com o alívio farmacológico; porém mais fundamental e mais importante é a abordagem não farmacológica, iniciado durante o pré-natal com o fornecimento de informações tranqüilizadoras à gestante e ao seu companheiro, e também à sua família, se necessário. O apoio empático de prestadores de serviço e acompanhantes, antes e durante o trabalho de parto, pode diminuir a necessidade de analgesia farmacológica e assim melhorar a experiência de dar à luz (veja 2.5).

Além do apoio durante o trabalho de parto (o fator mais importante), existem vários outros métodos para aliviar a dor do parto. O primeiro é a oportunidade de assumir qualquer posição que a parturiente deseje, no leito ou não, durante o andamento do trabalho de parto. Isto significa que ela não deve ficar restrita ao leito, e certamente não em decúbito dorsal, mas que deve ter a liberdade de adotar posturas verticalizadas, como sentada, em pé, ou deambular, sem interferência dos prestadores de serviço, especialmente durante o primeiro estágio do parto (veja 3.2).

Existem vários métodos não invasivos e não farmacológicos para o alívio da dor que podem ser utilizados durante o trabalho de parto. Para muitas mulheres, um banho de chuveiro ou de imersão diminui a dor. Com freqüência, toques ou massagens por um acompanhante são úteis. O mesmo acontece com métodos que auxiliam as mulheres a suportar a dor por meio de técnicas que concentram a atenção, como uma respiração ritmada e ofegante, comandos verbais e relaxamento, que desviam a atenção da parturiente de sua dor. Esses métodos são às vezes aplicados em conjunto com outras estratégias, incluindo uma variedade de abordagens psicossomáticas para apoiar a parturiente, como hipnose, música e biofeedback. Muitas mulheres consideram tais práticas úteis, e elas não são perigosas e podem ser recomendadas.

Os métodos não farmacológicos específicos para o alívio da dor em mulheres em trabalho de parto normal incluem métodos que ativam os receptores sensoriais periféricos (Simkin 1989). Um dos mais recentes é a estimulação elétrica nervosa transcutânea (TENS). O fato de ser auto-administrada contribuiu para o sucesso dessa técnica entre muitas mulheres, mas sua disponibilidade está limitada a áreas com alto nível de recursos, e sua eficácia não foi demonstrada em estudos randomizados (Erkolla et al 1980, Nesheim 1981, Bundsen et al 1982, Harrison et al 1986, Hughes et al 1986, Thomas et al 1988). Outras técnicas são o uso de calor e frio superficiais, acupuntura, imersão na água, ervas e aromaterapia com óleos perfumados Ainda não existem estudos randomizados para estabelecer a eficácia da maioria delas. Essas práticas deveriam passar pelo mesmo processo de revisão crítica exigido das intervenções farmacológicas. O mesmo se aplica a métodos semifarmacológicos, como injeções intradérmicas de água estéril em quatro pontos na região lombar (Enkin et al 1995).

Em conclusão, todas as culturas têm seus próprios métodos para cuidar e comandar gestantes; algumas explicam seus costumes de um modo mágico, e outras procuram dar uma explicação mais lógica para o sistema que aplicam. Uma característica comum de muitos desses métodos é a atenção dedicada à mulher durante a gestação e o parto; talvez por esta razão tantas delas considerem-nas úteis e reconfortantes. Os relatos que mulheres as consideram reconfortantes são principalmente derivados de observações, mas, mesmo assim, vários desses métodos não são perigosos, e seu uso em mulheres cuja dor é aliviada por eles pode se justificado. O treinamento em aconselhamento e capacidade de comunicação interpessoal são crucias para todas as pessoas que prestam assistência a gestantes (Kwast 1995a).

2.6.2. Alívio da Dor durante o trabalho de parto por meios farmacológicos

Os métodos farmacológicos para o alívio da dor têm sido amplamente aplicados especialmente nos países desenvolvidos. Os efeitos de várias técnicas foram investigados por meios de estudos clínicos; os benefícios do alívio da dor foram claros mas os possíveis efeitos adversos sobre a mãe ou o recém-nascido receberam menos atenção

Agentes Sistêmicos

Várias drogas foram e continuam a ser utilizadas para o alívio da dor: alcalóides opiáceos dos quais o mais popular, por ampla margem, é a petidina, seguidos por derivados fenotiazínicos (prometazma), benzodiazepínicos (diazepam) e outros. Em alguns países, o uso de analgesia no trabalho de parto normal diminuiu nos últimos anos (substituído pela analgesia peridural); o agente mais comumente empregado é o óxido nitroso combinado com 50% de oxigénio. Todos esses agentes podem fornecer um alívio razoável da dor mas a custo de efeitos colaterais indesejados (Dickersin 1989). Os efeitos colaterais maternos da petidina são hipotensão ortostática, náusea, vômitos e tonturas. Todas as drogas sistêmicas utilizadas para o alívio da dor, atravessam a placenta, e sabe-se que todas, com exceção do óxido nitroso, causam depressão respiratória no bebe e anormalidades de comportamento neonatal, incluindo relutância para mamar. O diazepam pode causar depressão respiratória neonatal, hipotonia, letargia e hiportermia (Dalen et al 1969, Catchlove e Kafer 1971, Flowers et al 1969, McCarthy et al 1973, McAllister 1980)

Analgesia Peridural

Dentre as diferentes técnicas de analgesia regional (peridural, caudal, paracervical, raque ou espinhal), a analgesia peridural é o método mais amplamente utilizado no trabalho de parto normal. Seus efeitos foram investigados em vários estudos, todos comparando a analgesia peridural a outras técnicas de controle da dor (Robinson et al 1980, Philisen e Jensen 1989, 1990, Swanstrom e Bratteby 1981, Thorp et al 1993). Ela fornece um alívio melhor e mais duradouro da dor do que agentes sistêmicos. A adoção da analgesia peridural na assistência obstétrica faz um uso intensivo de recursos e exige várias condições importantes: o trabalho de parto deve ocorrer num hospital bem equipado, o aparato técnico deve ser suficiente, deve sempre existir um anestesista disponível e requer uma supervisão especializada e constante da parturiente.

Com o uso da analgesia peridural, há uma tendência para que o primeiro estágio do trabalho de parto seja um pouco mais longo, e com o uso mais freqüente de ocitocina. Em vários relatos e estudos, constatou-se um aumento do número de partos vaginais operatórios, especialmente se o efeito analgésico foi mantido durante o segundo estágio do trabalho de parto, suprimindo assim o reflexo do puxo. Num estudo americano recente, o número de cesarianas aumentou quando se utilizou analgesia peridural, especialmente quando iniciada antes de 5cm de dilatação (Thorp et al 1993). Existem poucos dados de estudos randomizados sobre possíveis efeitos da analgesia peridural sobre a mãe ou o bebê, a longo prazo. Nenhum estudo randomizado comparou a analgesia peridural a “nenhum controle da dor” ou a um método não farmacológico; todas as comparações foram entre diferentes métodos de analgesia peridural, ou diferentes métodos de alívio farmacológico da dor. O principal efeito medido nos estudos era o grau de alívio de dor, mas nenhum deles aferiu a satisfação materna com o parto. Um estudo observacional (Morgan et al 1982) sugere que não há uma relação direta entre o alívio da dor e a satisfação. Num estudo de assistência em centros de parto na Suécia, o uso de analgesia peridural e outros métodos farmacológicos de alívio da dor era significativamente menor no grupo dos centros de parto em comparação com a assistência padrão; mesmo assim, não havia diferença entre os dois grupos quando se perguntava, dois meses após o nascimento, qual a atitude em relação à dor durante o parto. Aparentemente, muitas das mulheres encaravam a dor durante o parto sob uma perspectiva positiva, como uma sensação de realização, o que ilustra o caráter diferente da dor durante o parto comparada à dor relacionada à doença (Waldenstrôm e Niisson 1994). Num estudo com puérperas, o apoio de prestadores de serviço tinha um efeito positivo sobre a experiência global da mulher em relação ao parto, enquanto o alívio da dor não explicou nenhuma das variações nas respostas das mulheres (Waldenstrôm et al 1996).

Existem poucas dúvidas sobre a utilidade da analgesia peridural no trabalho de parto complicado. Entretanto, se ela for administrada a uma gestante de baixo risco, há dúvida se o procedimento resultante ainda pode ser chamado “parto normal”. Naturalmente, a resposta depende da definição de normalidade, mas a analgesia peridural é um dos exemplos mais marcantes da medicalização do parto normal, transformando um evento fisiológico num procedimento médico. A aceitação desta transformação é em grande parte determinada por fatores culturais. Por exemplo, nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha um grande número de gestantes de baixo risco dão à luz sob analgesia peridural, enquanto na grande maioria dos países em desenvolvimento muitíssimos partos ocorrem no domicílio, sem nenhum controle farmacológico da dor. Este não é apenas um contraste entre países em desenvolvimento e países desenvolvidos: nos Países Baixos, mais de 30 das gestantes dá a luz em sua casa, sem nenhum controle farmacológico da dor e, mesmo se o parto for hospitalar, apenas uma minoria das mulheres de baixo risco recebem medicação para alívio da dor (Senden et al 1988).

Em conclusão, na assistência ao parto normal, métodos não farmacológicos de alívio da dor, como atenção pessoal à parturiente, são da maior importância. Métodos que exigem um grande número de condições materiais e técnicas, como a analgesia peridural, somente podem ser aplicados em hospitais bem equipados e com funcionários suficientes. Em muitos países, essas condições técnicas não estão geralmente disponíveis, especialmente para o parto normal. Entretanto, a demanda por esses métodos é em grande parte determinada culturalmente, e a qualidade da assistência ao parto normal não depende da disponibilidade dessas condições. Elas não fazem parte dos cuidados essenciais durante o parto. Os métodos farmacológicos nunca devem substituir a atenção pessoal e o carinho.

2.7. Monitoramento Fetal Durante o Trabalho de Parto

O monitoramento do bem-estar fetal é parte dos cuidados essenciais durante o trabalho de parto. A ocorrência de sofrimento fetal, em geral por hipóxia, nunca pode ser totalmente afastada, mesmo que um trabalho de parto satisfaça os critérios de “normalidade”, ou seja: início a termo após uma gestação sem intercorrências, sem fatores que indiquem um maior risco de complicações. O risco de sofrimento fetal é um pouco mais alto durante o segundo estagio do trabalho de parto e no caso de parto prolongado.

2.7.1. Avaliação do Líquido Amniótico

A eliminação de mecônio pode refletir o sofrimento fetal e está associada à morte fetal durante o trabalho de parto e a morbidade ou morte neonatal (Matthews e Martin 1974, Gregory et al 1974, Fujikura e Klionsky 1975, Meis et al 1978, MacDonald et al 1985). Onde os serviços permitirem, a eliminação de mecônio durante o trabalho de parto é considerada uma indicação para que o prestador de assistência obstétrica primária encaminhe a parturiente a um nível mais complexo. A presença de mecônio espesso identificada após a ruptura das membranas tem o pior prognóstico: o mecônio concentrado também reflete um menor volume de líquido amniótico, o que em si é um fator de risco. A ausência de líquido amniótico no momento da ruptura das membranas também deve ser considerada um fator de risco. Um líquido amniótico levemente tinto de mecônio provavelmente reflete um risco bem menos grave, mas isto ainda não foi completamente investigado.

2.7.2. Monitoramento da Freqüência Cardíaca Fetal

A relação entre o bem-estar fetal e a freqüência cardíaca fetais foi investigada em numerosos estudos. Está claro que o sofrimento fetal pode se manifestar por anormalidades da freqüência cardíaca: bradicardia (< 120 bpm), taquicardia (>160 bpm), diminuição da variabilidade o desacelerações. Existem dois metidos para monitorar a freqüência cardíaca: ausculta intermitente e monitoramento eletrônico contínuo.

A ausculta intermitente pode ser realizada com um estetoscópio monoauricular (Pinard), como se faz desde o início do século XX, ou por um sonar portátil simples. Quando se utiliza o estetoscópio, em geral a mulher fica em decúbito dorsal ou lateral, embora seja possível auscultar os batimentos cardíacos mesmo com a parturiente em pé ou sentada. O sonar pode ser aplicado em várias posições. A ausculta é usualmente feita a cada 15-30m minutos durante o primeiro estágio do trabalho de parto, a após cada contração, no segundo estágio. Se necessário, comparam-se as freqüências cardíacas fetal e materna. A ausculta intermitente com o estetoscópio monoauricular é a única opção disponível para a grande maioria de prestadores de serviço na periferia, seja em centros de saúde ou no domicílio. Uma vantagem da ausculta intermitente é a sua simplicidade- um exemplo de tecnologia apropriada , com um instrumento (o estetoscópio monoauricular) de fabricação barata (pode ser até improvisado com bastante facilidade) e de fácil utilização, e que permite a livre movimentação da parturiente. Isto quer dizer que, com treinamento adequado, o prestador de serviços pode monitorar a freqüência cardíaca fetal em qualquer local, e não estar restrito num hospital com equipamentos técnicos sofisticados, tais como monitores eletrônicos. A vigilância da parturiente e do feto pode ser feita por uma enfermeira-parteira, no domicílio ou numa maternidade de pequeno porte.

O monitoramento eletrônico da freqüência cardíaca fetal é utilizado durante a gestação, para vigilância de gestações de alto risco, e também durante o trabalho de parto. Seu uso está normalmente limitado a partos hospitalares. O monitoramento é mais comumente feito por um transdutor de sonar Doppler externo,ou por um eletrodo interno (vaginal) preso ao escalpo do feto após a ruptura das membranas.

Embora a informação sobre a freqüência cardíaca fetal seja mais precisa pelo segundo método do que pela ausculta, sua interpretação é difícil: freqüentemente o traçado é interpretado de modo diferente por diferentes prestadores de serviços e até pela mesma pessoa em ocasiões distintas (Cohen et al 1982, Van Geijn 1987, Nielsen et al 1987). O método é altamente sensível em relação à detecção de sofrimento fetal, mas sua especificidade é baixa (Grant 1989). Isto significa que ele leva a uma alta taxa de falso-positivos, e conseqüentemente a um alto número de intervenções (desnecessárias), especialmente se utilizado num grupo de gestantes de baixo risco (Curzen et al 1984, Borthen et al 1989). Em gestações de alto risco e em casos de alto risco durante o trabalho de parto, o método comprovou ser útil e pode, além disso, tranqüilizar a mulher, embora seu uso inevitavelmente limite a sua capacidade de livre movimentação. Entre as desvantagens associadas à aplicação do monitoramento eletrônico está uma tendência de alguns prestadores de serviços, e mesmo de companheiros e familiares, de prestar atenção ao aparelho e não à mulher. Em alguns hospitais tecnicamente bem equipados, o monitoramento é até centralizado, permitindo que o atendente controle o monitor numa sala central, sem ser obrigado a entrar na sala de pré-parto.

2.7.3. Exame do sangue do escalpo fetal

Desde o início da década de 60, utiliza-se uma microtécnica de amostragem de sangue do escalpo para confirmar a presença de hipóxia fetal e verificar o equilíbrio ácido-básico do sangue, especialmente o pH. Existem algumas dúvidas quanto à representatividade de uma amostra sanguínea obtida de uma região cronicamente edemaciada e quanto à reprodutibilidade, mas, mesmo assim, o valor do método foi comprovado no uso clínico, em combinação com o monitoramento da freqüência cardíaca fetal. O método faz uso intensivo de recursos, é caro, invasivo, consome tempo, é incômodo para o prestador de serviços e para a parturiente. Como no caso do eletrodo de escalpo, seu uso pode ocasionalmente resultar em traumatismo, infecção e possivelmente dor para o feto. Finalmente, requer a disponibilidade contínua de laboratório e pessoal capacitado. Portanto, seu uso está em geral limitado a serviços obstétricos hospitalares de maior porte, que atendem muitos casos de alto risco. Seu papel na vigilância do trabalho de parto de baixo risco é limitado: somente para fins diagnósticos após a detecção de anormalidades da freqüência cardíaca fetal (Grant 1989).

2.7.4. Comparação entre a ausculta e o monitoramento eletrônico fetal

Esses dois métodos de vigilância fetal foram comparados em vários estudos (Haverkamp et al 1976, 1979, Kelso et al 1978, MacDonald et al 1985, Wood et al 1981, Neldam et al 1986). Tanto a taxa de cesarianas quanto a de partos vaginais operatórios foram mais altas nos grupos com monitoramento eletrônico. Se a estimativa do pH do sangue do escalpo não estivesse disponível, o aumento nas taxas de cesarianas seria ainda maior. Existem poucas evidências que o maior número de intervenções nos grupos com monitoramento eletrônico tenha resultado em benefícios importantes para os bebês. A mortalidade perinatal e a ocorrência de baixos escores de Apgar não eram menores nos grupos monitorados eletronicamente. Apenas uma medida de resultado neonatal, convulsões neonatais, apresentava melhora com o monitoramento eletrônico no maior estudo (MacDonald et al 1985). Uma análise mais aprofundada deste estudo sugeriu que o excesso de risco de convulsão neonatal no grupo da ausculta limitava-se principalmente a trabalhos de parto onde a ocitocina tinha sido utilizada para indução ou correção da dinâmica. O acompanhamento dos lactentes com convulsão mostrou uma incidência igual de problemas neurológicos importantes nos grupos monitorados por meios eletrônicos e por ausculta.

Esses dados têm conseqüências importantes para a vigilância fetal durante o trabalho de parto normal. O aumento substancial de intervenções caso o parto seja monitorado por meios eletrônicos concorda com a baixa especificidade do método em casos de baixo risco; e não parece levar a benefícios importantes para o lactente. A única exceção é a ocorrência de convulsões neonatais. Entretanto, essas ocorreram primariamente em crianças nascidas após o uso de infusões de ocitocina, e pode-se perguntar, com razão, se o trabalho de parto induzido ou corrigido por ocitocina deve ser considerado “normal”. Em países com instalações sofisticadas e uma alta proporção de partos hospitalares, o trabalho de parto induzido ou com correção de dinâmica pelo uso de ocitocina ou prostaglandinas é considerado de alto risco, e somente ocorre sob a responsabilidade do obstetra; nesse caso, a vigilância fetal é feita por enfermeiras-parteiras com ausculta intermitente em partos normais, mas com monitoramento eletrônico após o encaminhamento para correção da dinâmica com ocitocina, o número de convulsões neonatais foi muito pequeno (Van Alten et al 1989, Treffers et al 1990).

O monitoramento eletrônico intermitente é uma variação do monitoramento eletrônico contínuo. Este método é utilizado durante um período de meia hora no início do trabalho de parto, e subseqüentemente por períodos de aproximadamente vinte minutos, a intervalos regulares. Num estudo randomizado, Herbst e Ingemarsson (1994) compararam este método com o monitoramento contínuo: os resultados nos dois grupos foram igualmente bons. Embora nesse estudo a taxa de intervenção fosse baixa nos dois grupos, é de se esperar que, se o método fosse amplamente adotado no trabalho de parto normal, apresentaria as mesmas desvantagens do monitoramento contínuo, embora talvez elas fossem menos óbvias. Essas desvantagens incluem a restrição de movimentos durante sua aplicação e a baixa especificidade; com as intervenções decorrentes. Além disso, seu uso rotineiro poderia levar à falta de confiança na ausculta intermitente, caso haja qualquer sugestão que a ausculta pudesse ser menos confiável do que o monitoramento eletrônico. É claro que deve-se diferenciar entre o uso rotineiro do monitoramento fetal eletrônico intermitente e o recurso ao monitoramento eletrônico (onde disponível) quando a ausculta indicar a possibilidade de sofrimento fetal; esta prática leva a uma maior atenção, na ausculta, de desvios da normalidade.

Em conclusão, o método de escolha para o monitoramento fetal durante o trabalho de parto normal é a ausculta intermitente. Em muitos países, este é o único método disponível para a grande maioria das mulheres. Porém, também em países industrializados, onde o acesso a equipamentos eletrônicos é mais fácil, a ausculta é o método de escolha no trabalho de parto normal. A assistência individualizada à parturiente é essencial, e pode ser feita com mais facilidade por ocasião do contato pessoal necessário para a ausculta periódica. O monitoramento eletrônico parece apresentar vantagens apenas em mulheres com maior risco, tias como trabalho de parto induzidos ou com correção de dinâmica, complicados por líquido amniótico meconial ou por qualquer outro fator de risco. Na maioria dos trabalhos de parto sem risco aumentado, o monitoramento eletrônico aumenta o número de intervenções sem que haja um benefício claro para o feto e com um grau de desconforto adicional para a mulher.

2.8. Higiene

Onde quer que ocorram o trabalho de parto e o parto, a higiene é um requisito básico e importantíssimo. Não há necessidade do tipo de esterilização comumente utilizado num bloco cirúrgico, mas as unhas devem ser não apenas limpas como também curtas, e as mãos devem ser cuidadosamente lavadas com água e sabão. Deve-se dar atenção à higiene pessoal da parturiente e das pessoas que realizam o parto, bem como à higiene do ambiente e de todos os materiais utilizados durante o parto. Em alguns países, usam-se tradicionalmente máscaras e aventais estéreis, a fim de proteger a parturiente de infecções. Para este propósito, elas são inúteis (Crowther et al 1989). Entretanto, em regiões com altas prevalências de HIV e dos vírus das hepatites B e C, vestimentas de proteção são úteis para proteger o parteiro do contato com sangue e outros materiais contaminados (OMS 1995).

A OMS estabeleceu o conteúdo de um kit de parto e as condições para seu uso correto e eficaz (OMS 1994a). Os programas já implementados para advogar o efeito positivo do uso das “três áreas limpas” (mãos, períneo, cordão umbilical) devem ser mantidos ou expandidos. O conteúdo do kit de parto podem variar de país para país, mas deve satisfazer as necessidades específicas das parturientes e ser de fácil obtenção em qualquer esquina e em todas as regiões de difícil acesso de um país. Esse kit simples mas eficaz pode até ser montado em casa, e inclui uma lâmina nova e estéril para cortar o cordão umbilical. O próprio kit de parto e seu conteúdo deve ser limpos, mas não precisa ser esterilizado. Os materiais descartáveis do kit não devem ser reutilizados.

Os instrumentos destinados a ser reutilizados devem ser adequadamente descontaminados, segundo as diretrizes fornecidas pela OMS (1995). Equipamentos que entram em contato com a pele intacta podem ser lavados meticulosamente, instrumentos que entram em contato com mucosas ou pele não intacta (com solução de continuidade) devem ser sempre esterilizados, fervidos ou desinfetados quimicamente, e instrumentos que penetram na pele devem ser esterilizados. Esses métodos servem para impedir a contaminação de mulheres e prestadores de serviços.

Algumas medidas devem ser tomadas em todos os partos, a fim de impedir a possível infecção da mulher e/ou do parteiro. Essas medidas incluem evitar o contato direto com sangue e outros líquidos corporais, por meio do uso de luvas durante o exame vaginal, durante o desprendimento do bebê, e no manejo da placenta. É importante reduzir o potencial de infecção, limitando as técnicas invasivas, como a episiotomia, aos casos estritamente necessários e tendo cuidados adicionais com o uso e descarte de instrumentos afiados (durante a sutura, por exemplo) (ICN 1996).

3. ASSISTÊNCIA DURANTE O PRIMEIRO ESTÁGIO DO PARTO

3.1. Avaliação do Início do Trabalho de Parto

A avaliação do início do trabalho de parto é um dos aspectos mais importantes do seu manejo. Os sinais do início do trabalho de parto são:

–contrações dolorosas com uma certa regularidade
–apagamento e/ou dilatação do colo
–perda de líquido amniótico
–secreção sanguinolenta

A ruptura de membranas é um sinal claro da ocorrência do início de trabalho de parto. Os outros sintomas são menos óbvios: podem-se sentir contrações muito antes do verdadeiro início do trabalho de parto, e pode haver dilatação cervical semanas antes do término da gestação, progredindo lentamente até o momento do trabalho de parto (Crowther 1989). Apesar dessas dificuldades, o parteiro deve ser capaz de diferenciar entre o falso trabalho de parto e o início do trabalho de parto; em geral, é necessário um exame vaginal para detectar alterações do colo.

O estabelecimento do início do trabalho de parto é, inevitavelmente, a base para identificar um trabalho de parto prolongado, exigindo ação. Se o diagnóstico “início do trabalho de parto” for errôneo, o resultado pode ser intervenções, como amniotomia ou infusões de ocitocina, desnecessárias. Em geral, é melhor substituir o diagnóstico “fase latente prolongada” por “falso trabalho de parto”, porque na realidade o trabalho de parto ainda não começou. Algumas vezes, a distinção entre “início do trabalho de parto” e “falso trabalho de parto” somente pode ser feita após um breve período de observação. No estudo multicêntrico da OMS sobre o partograma (OMS 1994b), somente 1,3% das mulheres apresentaram uma fase latente prolongada. Podem existir duas causas para esta porcentagem pequena: com a introdução do partograma nos hospitais, houve discussões sobre o manejo do parto que podem ter afetado a percepção da fase latente. Por outro lado, a intervenção ativa na fase latente é adiada por 8 horas no partograma.

A ruptura espontânea das membranas antes do trabalho de pato (RPM) a termo provoca uma viva discussão sobre o risco do exame vaginal (Schutte et al 1983), a indução do trabalho de parto e uso profilático de antibióticos. Num estudo randomizado recente sobre indução após 12 horas versus um manejo expectante durante 48 horas, no grupo de indução houve uma necessidade significativamente maior de analgésicos e mais intervenções; a ocorrência de infecções neonatais leves foi de 1,6% no grupo de indução e 3,2% no grupo com manejo expectante. A utilização profilática de antibióticos não foi feita de modo rotineiro, e o exame vaginal só era realizado se o trabalho de parto já tivesse iniciado (Ottervanger et al 1996). Uma abordagem conservadora, apoiada pelas evidências existentes, indicaria uma conduta que requer observação, sem exames vaginais e sem uso de antibióticos, durante as primeiras 48 horas após a RPM. Se o trabalho de parto não tiver iniciado espontaneamente durante este período (em cerca de 20% das mulheres), deve-se considerar a indução com ocitocina. Entretanto, esses resultados foram obtidos em populações de mulheres saudáveis de países desenvolvidos, e em hospitais onde era possível manter continuamente altos padrões de higiene. Nutras populações, um manejo ativo, incluindo o uso de antibióticos e a indução precoce do parto, pode ser aconselhável. Côo nos países em desenvolvimento a sépsis puerperal freqüentemente é a terceira ou quarta causa de mortalidade materna, devem-se envidar todos os esforços possíveis para evitá-la, qualquer que seja sua origem.

3.2. Posição e Movimento durante o Primeiro Estágio do trabalho de parto

Vários estudos mostram que, durante o primeiro estágio do trabalho de parto, o decúbito dorsal (supino) afeta o fluxo sanguíneo uterino. O útero pesado pode causar uma compressão aortocava, e o menor fluxo sanguíneo pode comprometer o estado fetal. A posição supina também reduz a intensidade das contrações (Flynn et al 1978, McManus e Calder 1978, Williams et al 1980), Chen et al 1987), e portanto interfere com o progresso do trabalho de parto. Ficar em pé ou em decúbito lateral está associado a uma maior intensidade e maior eficiência das contrações (sua capacidade de causar a dilatação cervical).

Embora o decúbito dorsal continue a ser a posição mais prevalente, as parturientes têm muitas opções. Entretanto, várias limitações freqüentemente restringem tais opções, desde o desenho da mesa de parto a protocolos de parto ou o uso rotineiro de cateterização venosa ou equipamento de monitoramento. Quando essas limitações são mantidas num nível mínimo, as parturientes podem ficar em pé, caminhar, sentar-se ou ficar de quatro, tomar um banho de chuveiro ou de imersão para relaxar ou adotar alternadamente cada uma dessas posições, conforme desejarem. Estudos comparando essas posições ao decúbito supino revelaram que, nas posições não supinas, em média, o trabalho de parto era percebido como menos doloroso (havia menos necessidade de analgesia) e a correção da dinâmica era utilizada menos freqüentemente (Chan 1963, Flynn et al 1978, McManus e Calder 1978, Diaz et al 1980, Williams et al 1980, Hemminki 1983, Melzack 1991). Um estudo (Flynn et al 1978) revelou uma incidência significativamente menor de anormalidade de batimentos cardíacos fetais em posições verticalizadas, porém outros estudos não detectaram diferenças significativas em relação aos resultados neonatais.

Em conclusão, não há indícios que apóiem o estímulo à posição supina durante o primeiro estágio do trabalho de parto. A única exceção é quando houver rompimento de membranas em presença de uma cabeça fetal não encaixada. Se e quando as membranas já tiverem rompido e o parteiro tiver determinado que a cabeça fetal está suficientemente encaixada, as parturientes devem ter liberdade e serem estimuladas a adotar sua posição preferida durante o trabalho de parto. A mudança de posição é freqüente, já que nenhuma delas é confortável durante muito tempo.

3.3. Exame Vaginal

Esta é uma das atividades diagnosticas essenciais na avaliação do início e do progresso do trabalho de parto. Somente deve ser realizado por parteiros treinados, com mãos limpas e usando luvas estéreis. O número de exames vaginais deve ser limitado ao estritamente necessário; durante o primeiro estágio do parto, um a cada 4 horas em geral é suficiente, conforme prescrito no manual para o uso do partograma (OMS 1993). Se o trabalho de parto decorre sem problemas, parteiros experientes podem às vezes fazer um único exame. Idealmente, este seria o exame necessário para determinar que há um trabalho de parto ativo, isto é, para confirmar o fato que há dilatação cervical (o critério mais objetivo de trabalho de parto ativo). Outra prática no manejo do trabalho de parto é somente realizar um exame vaginal quando houver uma indicação desta necessidade, por exemplo quando a intensidade e a freqüência das contrações diminuem, quando há o tampão mucoso (sinal do sangramento) ou a presença do puxo involuntário,ou antes de administrar a analgesia.

Pode-se dizer alguma coisa em favor de cada uma das abordagens acima mencionadas, mas, considerando nosso axioma: “No parto normal, deve existir uma razão válida para interferir no processo natural”, talvez as duas últimas condutas tenham mais peso do que a primeira. Entretanto, muitas perguntas ainda permanecem, uma vez que não existem indícios claros em favor de nenhuma prática específica. Talvez sejam necessárias normas mais estritas naqueles países onde as pessoas que realizam os partos têm um menor nível de treinamento e estão isoladas, a grandes distâncias dos centros de referência. Nesses casos, as normas seriam específicas para cada país.

Em instituições de treinamento, um exame vaginal feito por um estudante às vezes deve ser repetido e verificado pelo supervisor. Isto somente pode ser feito depois de obter o consentimento da parturiente. Em nenhuma circunstância as mulheres devem ser coagidas a passar por exames vaginais repetidos ou freqüentes feitos por vários prestadores de serviço ou treinandos.

Antigamente, recomendava-se o exame retal, a fim de evitar a contaminação da vagina. Esta prática não é recomendada. Estudos comparando exames vaginais e retais mostraram uma incidência similar de infecção puerperal independente do uso de exames vaginais ou retais durante o trabalho de parto (Crowther et al 1989). A preferência das mulheres pelo exame vaginal em relação ao retal foi claramente demonstrada num estudo clínico randomizado (Murphy et al 1986).

3.4. Monitoramento da Progressão do Trabalho de Parto

A avaliação da progressão do trabalho de parto é feita pela observação da mulher; sua aparência, comportamento, contrações e descida da apresentação. A medida mais precisa é a dilatação cervical. O desvio da velocidade de dilatação arbitrariamente definida como normal deveria ser uma indicação para rever os planos de manejo do trabalho de parto. No método do partograma da OMS (OMS 1993), a curva de alerta é ultrapassada se a dilatação for menor do que 1 cm por hora; se a mulher estiver num centro de saúde, este é um motivo de encaminhamento a um hospital. A curva de ação é ultrapassada se o atraso no progresso continuar por mais quatro horas. Deve-se então fazer uma avaliação crítica da causa do atraso, e tomar uma decisão sobre o manejo apropriado. Embora nem todos os países obedeçam essas regras estritas, elas são diretrizes valiosas, especialmente nas situações onde a distância até um centro de referência for grande, e a pessoa que realiza o parto estiver isolada.Pesquisas sobre o efeito do uso do partograma mostraram que, em mais de 20 % dos partogramas de primigrávidas, a curva de alerta, e em 10-11% a curva de ação, eram ultrapassadas (Philpott e Castle 1972, OMS 1994b). Na América Latina utiliza-se um partograma diferente, diferenciando nulíparas e multíparas, membranas intactas e rotas, e decúbito e posição verticalizada (Schwarcz et al 1987-1997).

A relação entre o trabalho de parto prolongado e resultados maternos e fetais adversos é a razão da grande importância do monitoramento cuidadoso e acurado do progresso do trabalho de parto. Não existe certeza sobre o grau de causalidade dessa relação. Um progresso lento deveria ser um motivo para avaliação, e não para intervenção. Quando o trabalho de parto for lento, deve-se considerar a possibilidade de desproporção céfalo-pélvica. Não se comprovou a utilidade da pelvimetria por raios-X durante o trabalho de parto. Os estudos existentes de pelvimetria pro raios-X mostram um aumento de intervenções como cesarianas, mas nenhum benefício em termos de menos morbidade neonatal (Parsons e Spellacy 1985). O uso da pelvimetria por raios-X durante a gestação e o trabalho de parto aumenta a incidência de leucemia no primeiro ano de vida e deve ser abolido (Stewart et al 1956, MacMahn 1985). Em mãos experientes, a pelvimetria manual pode ser útil. Se as membranas ainda estiverem intactas durante o trabalho de parto, em geral o progresso lento não é causado por desproporção. Nestes casos, o manejo expectante seria uma opção (Albers et al 1996). Como não existe nenhuma evidência sólida derivada de pesquisas sobre a comparação de manejo expectante e manejo ativo em casos de progresso lento sem sinais de desproporção, não se pode chegar a conclusões precisas. Quando houve ruptura das membranas, é mais provável que o progresso lento seja conseqüência de problemas mecânicos. O manejo em casos de trabalho de parto anormal está além do escopo desde relatório.

3.5. Prevenção do Trabalho de Parto Prolongado

Várias medidas foram propostas para evitar o retardo no progresso do trabalho de parto; essas ações às vezes são iniciadas muito antes que a curva de ação ou mesmo a curva de alerta do partograma tenham sido alcançadas. As intervenções mais ativas são a amniotomia precoce e a infusão precoce de ocitocina, ou uma combinação de ambas. A amniotomia precoce interfere com o momento fisiológico de ruptura das membranas fetais. Em condições normais, em 75% dos casos as membranas permanecem intactas até a dilatação completa (Schwarcz et al 1995). A amniotomia antes da dilatação completa é freqüentemente realizada como um método para acelerar o trabalho de parto.

3.5.1. Amniotomia Precoce

Essa intervenção foi recomendada como um procedimento de rotina uma hora após a hospitalização em trabalho de parto (O`Driscoll et al 1973). Num estudo controlado, verificou-se um aumento considerável de desacelerações de tipo I dos batimentos cardíacos fetais após a amniotomia precoce (Schwarcz 1973). Vários estudos randomizados sugerem que a amniotomia precoce leva a uma redução de em média entre 60 e 120 minutos na duração do trabalho de parto, sem efeitos sobre o uso de analgesia e as taxas de parto operatório. Os estudos não fornecem nenhuma evidência que a amniotomia precoce tenha um efeito favorável ou desfavorável sobre o estado do recém-nascido (Fraser et al 1991,1993, Barrett et al 1992). Não é possível concluir que a amniotomia precoce apresenta uma vantagem clara em relação ao manejo expectante, ou o inverso. Portanto, no trabalho de parto normal deveria haver um motivo válido para interferir com o momento espontâneo de ruptura das membranas.

3.5.2. Infusão Intravenosa de Ocitocina

É freqüentemente utilizada para acelerar o trabalho de parto após a ruptura espontânea ou artificial das membranas. A combinação com a amniotomia precoce é freqüentemente chamada “manejo ativo do trabalho de parto”, e foi primeiro advogada como tal na Irlanda (O´Driscoll et al 1973, O’Driscoll e Meagher 1986). Em forma mais ou menos modificada, a técnica foi amplamente adotada em todo o mundo. Segundo os protocolos originais para o manejo ativo do trabalho de parto, após a amniotomia precoce são realizados exames vaginais de hora em hora, administrando-se ocitocina caso a velocidade de dilatação cervical seja menor do que 1 cm por hora. A prática foi investigada em vários estudos randomizados (Read et al 1981, Hemmmki et al 1985, Bidgood e Steer 1987, Cohen et al 1987, Lopez-Zeno et al 1992). Dentre os três estudos fornecendo dados sobre a duração do trabalho de parto após a correção da dinâmica com ocitocina, em comparação com grupos controle, apenas um mostrou uma menor duração média com o uso de ocitocina. Num estudo, as mulheres no grupo controle foram estimuladas a sair do leito e caminhar, ficar em pé ou sentar, segundo sua preferência. Neste grupo controle, a duração média do trabalho de parto foi levemente menor do que no grupo com correção de dinâmica. Não havia diferença nos escores de Apgar ou na incidência de internação numa unidade de tratamento intensivo neonatal entre os grupos com correção da dinâmica com ocitocina e controle (Hemmmki et al 1985). Este estudo incluiu a opinião das parturientes sobre o procedimento. A maioria disse que o procedimento de correção de dinâmica era desagradável. Mais de 80% achavam que a correção tinha causado um aumento de sua dor. Metade das mulheres no grupo controle que tinham condições de deambular disseram que esta mobilidade tinha diminuído sua dor, enquanto 24% não sentiram nenhuma diferença.

Em conclusão, não está claro, com base nos dados disponíveis, que o uso liberal da correção da dinâmica com ocitocina (“manejo ativo do trabalho de parto”) ofereça benefícios para mulheres e bebês. É claro que isto não significa que a ocitocina não seja útil no tratamento do trabalho de parto prolongado. Entretanto, não há indícios que a prevenção do trabalho de parto prolongado por meio do uso liberal da ocitocina no trabalho de parto normal seja benéfica. É justo perguntar se o trabalho de parto com correção de dinâmica pela infusão de ocitocina ainda pode ser considerado normal. Em muitos locais, a infusão de ocitocina somente é feita em ambiente hospitalar, sob a responsabilidade do obstetra. Esta é uma preocupação razoável, dada a natureza imprevisível do trabalho de parto manejado artificialmente. Em regra geral, a ocitocina somente deveria ser usada para corrigir a dinâmica do trabalho de parto em instituições onde houver acesso imediato à cesariana, caso ela seja necessária. A necessidade de correção de dinâmica é considerada uma indicação para o encaminhamento a serviços obstétricos com capacidade cirúrgica. A vigilância fetal subseqüente será feita por monitoramento eletrônico onde este for disponível, e não por ausculta intermitente. A experiência em Dublin durante o estudo randomizado do monitoramento dos batimentos cardíacos fetais durante o parto também aponta nessa direção: no grupo monitorado pela ausculta, o número de convulsões neonatais estava aumentado, mas a maioria desses recém-nascidos eram filhos de mães que tinham tido correção de dinâmica do trabalho de parto com ocitocina (MacDonald et al 1985). Veja também 2.7. A correção de dinâmica com ocitocina é uma intervenção importante e somente deve ser implementada com uma indicação válida. Isto também é válido para a variação mais moderna, correção de dinâmica com prostaglandinas, e para a indução do trabalho de parto com essas substancia.

3.5.3. Administração Intramuscular de ocitocina

O uso de qualquer ocitócito intramuscular antes do parto da criança geralmente é considerado perigoso e não pode ser adaptada ao grau de atividade uterina. Pode levar à hiperestimulação e é perigosa para o feto. Um aumento na incidência de ruptura uterina, com seqüelas graves decorrentes, também foi relacionado a esta prática (Kone 1993 Zheng 1994). Mesmo assim, a administração intramuscular de ocitocina ainda é praticada, às vezes a pedido da gestante ou sua família, esperando um parto mais rápido. Em alguns países em desenvolvimento, a droga pode ser adquirida no mercado. Esta prática perigosa deve ser abandonada. Isto também se aplica à administração de ouros ocitócitos, como as prostaglandinas, em qualquer momento do trabalho de parto, de um modo tal que seu efeito não possa ser controlado.

4. ASSISTÊNCIA DURANTE O SEGUNDO ESTÁGIO DO PARTO

4.1. Antecedentes Fisiológicos

Durante o segundo estágio do trabalho de parto, a oxigenação do feto sofre uma redução gradual porque o feto está sendo expelido da cavidade uterina, com a conseqüente retração do útero e diminuição da circulação placentária. Além disso, contrações fortes e um puxo extenuante podem diminuir ainda mais a circulação útero-placentária. A queda na oxigenação é acompanhada por acidose. Entretanto existem grandes diferenças individuais na velocidade e seriedade desse processo, e portanto o prestador de serviços deve monitorar cuidadosamente o estado fetal.

4.2. Início do Segundo Estágio

O início do segundo estágio é marcado pelos seguintes sintomas:

–a mulher sente um puxo involuntário, porque o saco amniótico ou a apresentação protrui através do colo dilatado, pressionando o reto;
–freqüentemente há ruptura espontânea de membranas;
–geralmente a dilatação cervical é completa, mas às vezes a parturiente tem o puxo involuntário num estágio precoce da dilatação. Se ainda houver uma fímbria de colo, ela será afastada lateralmente pela apresentação.

A partir disso, fica claro que, com freqüência, não se sabe com exatidão o momento de início do segundo estágio. Uma mulher pode ter o puxo involuntário antes que a dilatação esteja completa, ou ainda não senti-la quando esta for diagnosticada. Se o diagnóstico for feito por exame vaginal, não se pode saber com certeza há quanto tempo esta situação estava presente.

Em alguns hospitais, é costume transferir a mulher da sala de pré-parto a uma “sala de parto” específica no início do segundo estágio. Em geral a sala de parto é equipada com luzes fortes e brilhantes, instrumentos e uma mesa obstétrica com hastes de litotomia e estribos ou perneiras metálicas. Embora este ambiente seja mais conveniente para o prestador de serviços, caso se comtemple um parto operatório, qualquer transferência desnecessária é desagradável para a parturiente. No trabalho de parto normal não há necessidade de transferir a parturiente para outra sala no início do segundo estágio. O trabalho de parto e o parto podem perfeitamente ser atendidos na mesma sala.

4.3. Início do Puxo durante o Segundo Estágio

Os prestadores, freqüentemente, decidem a respeito do início do segundo estágio, estimulando a parturiente a fazer força (puxos), seja quando se diagnostica a dilatação total ou às vezes até antes. A abordagem fisiológica é esperar até que a própria mulher sinta a necessidade do puxo. Mesmo quando a dilatação é completa, às vezes, ainda não existe o puxo involuntário; esperando-se dez ou vinte minutos, a fase de expulsão pode iniciar espontaneamente. Não existem estudos controlados comparando puxos precoces e tardios no trabalho de parto normal, mas foram feitos alguns estudos em pacientes que receberam analgesia peridural. Como há a supressão do reflexo do puxo, é fácil retardar os puxos até que o vértice esteja visível no intróito. Este procedimento foi comparado com puxos assim que se diagnosticou a dilatação completa (McQueen e Mylrea 1977, Maresh et al 1983, Buxton et al 1988). O retardo dos puxos não apresentou nenhum efeito perigoso sobre o resultado fetal ou neonatal. No grupo de puxos precoces, ocorreu um número significativamente maior de uso de fórceps. Embora os resultados tenham sido obtidos em parturientes que receberam analgesia peridural, estão de acordo com a experiência clínica de parteiras que retardam o puxo até o aparecimento do reflexo espontâneo de puxo. Esta prática é mais fácil para a mulher e tende a encurtar a fase do puxo.

No momento do início do puxo ou antes, às vezes aconselha-se cateterizar e esvaziar a bexiga de rotina. Esta prática é desnecessária e pode causar infecção das vias urinárias. Durante o segundo estágio, quando a cabeça fetal está firmemente encaixada, a cateterização pode ser difícil e até mesmo traumática. É aconselhável estimular a mulher a urinar espontaneamente durante o primeiro estágio do trabalho de parto; no parto normal, isto em geral será suficiente.

4.4. Procedimento do Puxo durante o Segundo Estágio

A prática de estimular puxos longos e dirigidos (manobra de Valsalva) durante o segundo estágio do trabalho de parto é amplamente advogada em muitas maternidades. A alternativa é apoiar o padrão espontâneo de esforços expulsivos da mulher (puxo durante a expiração). Vários estudos compararam essas duas práticas (Bamett e Humenick 1982, Knauth e Haloburdo 1986, Parnell et al 1993, Thomson 1993). O puxo involuntário resultou em três a cinco puxos relativamente curtos (4-6 segundos) a cada contração, comparado com uma puxos continuados com 10-30 segundos de duração, acompanhados por apnéia forçada. O segundo método resulta em segundo estágios um pouco mais curtos, mas pode causar alterações de freqüência respiratória e volume de ejeção induzidas pela respiração. Se a mulher estiver em decúbito dorsal, pode haver também compressão da aorta e redução do fluxo sanguíneo ao útero. Nos estudos publicados, o pH médio na artéria umbilical foi menor nos grupos com puxos prolongados, e havia uma tendência para depressão dos escores de Apgar. As evidências existentes são poucas, mas delas emerge um padrão onde os puxos prolongados e precoces resultam numa diminuição modesta da duração do segundo estágio, mas isto não parece trazer nenhum benefício; parece haver comprometimento das trocas gasosas materno-fetais. O puxo espontâneo mais curto parece ser superior (Sleep et al 1989).

Em muitos países, é comum a prática de fazer pressão no fundo do útero durante o segundo estágio do trabalho de parto, com a intenção de acelerar o nascimento. Às vezes isto é feito pouco antes do desprendimento, às vezes desde o início do segundo estágio. Além do aspecto do maior desconforto materno, suspeita-se que esta prática possa ser perigosa para o útero, o períneo e o feto, mas não existem dados de pesquisa sobre esse assunto. A impressão é que, no mínimo, o método é usado com muita freqüência, sem que existam evidências de sua utilidade.

4.5. Duração do Segundo Estágio

Em 1930, De Snoo determinou a duração do segundo estágio do trabalho de parto em 628 primíparas com fetos em apresentação cefálica, encontrando uma duração média de 1 ¼ horas, com uma mediana de 1 hora. Esses valores sofriam forte influência da ocorrência de alguns períodos muito longos (10-14 horas). Desde então, a duração média do segundo estágio foi grandemente determinada pela interrupção artificial do trabalho de parto após o período máximo permitido pelo parteiro. Atualmente, em primíparas, a duração média do segundo estágio freqüentemente é relatada como sendo de aproximadamente 45 minutos. A associação de (um segundo estágio prolongado com hipóxia fetal e acidose foi um incentivo para interromper o segundo estágio, mesmo na ausência de problemas maternos ou fetais explícitos. Esta política foi examinada em estudos controlados (Wood et al 1973, Katz et al 1982, Yancey et al 1991). O término artificial do trabalho de parto após um segundo estágio sem complicações resultou em valores significativamente mais altos de pH na artéria umbilical, sem qualquer outra evidência de um efeito benéfico para o recém-nascido. O traumatismo materno e o ocasional traumatismo fetal resultante da maior interferência cirúrgica envolvida nesta prática dificilmente podem ser justificados. Se as condições maternas e fetais forem boas e se o trabalho de parto estiver progredindo, não há razão para aderir rigidamente a uma duração estipulada do segundo estágio, por exemplo de uma hora.

Existem vários estudos de acompanhamento sobre o estado do recém-nascido após um segundo estágio de diferentes durações. No estudo de Wormerveer (Van Alten et al 1989, Knuist et al 1989), examinou-se uma coorte de 148 recém-nascidos, utilizando a determinação do pH da artéria umbilical e o escore neurológico (Prechtl) na segunda semana de vida. O segundo estágio do trabalho de parto variou de <60 minutos (66% das nulíparas) a 159 minutos. Não foi encontrada nenhuma correlação entre a duração do segundo estágio e o estado do recém-nascido. Recentemente, foi publicado um estudo de acompanhamento de 6.759 recém-nascidos primogênitos em apresentação cefálica, pesando >2.500 g; em 11% , o segundo estágio do trabalho de parto durou >3 horas. Não se encontrou nenhuma correlação entre a duração do segundo estágio e baixos escores de Apgar aos 5 minutos, convulsões neonatais ou internação na unidade de tratamento intensivo neonatal (Menticoglou et al 1995).

Em conclusão, as decisões sobre a interrupção do segundo estágio do trabalho de parto devem ser baseadas na vigilância do estado materno e fetal e no progresso do trabalho de parto. Se houver sinais de sofrimento fetal ou não houver descida da apresentação, existem boas razões para interromper o trabalho de parto; porém, se o estado da parturiente for satisfatório, o feto estiver em boas condições e houver indícios de progresso na descida da apresentação cefálica, não existem fundamentos para intervenção. Entretanto, após um segundo estágio de > 2 horas em nulíparas e > 1 hora em multíparas, as possibilidades de parto espontâneo dentro de um prazo razoável diminuem, devendo-se contemplar a finalização do parto.

Em todo o mundo, tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento, o número de partos operatórios aumentou acentuadamente nas últimas décadas. As causas disso não são conhecidas com exatidão, mas além da já mencionada adesão rígida a uma duração estipulada do segundo estágio, a incidência de partos operatórios pode sofrer a influência do receio de processos por imperícia, da conveniência pessoal e de lucro financeiro. Pesquisas entre obstetras e residentes nos Países Baixos mostraram que a tendência para intervenções mais freqüentes era neutralizada pela presença de enfermeiras-parteiras num hospital (Pel et al 1995). Aparentemente, a assistência obstétrica por profissionais que não estão qualificados para interferir, mas que agem com vistas a preservar a normalidade, pode evitar intervenções desnecessárias. É necessária mais atenção à epidemia mundial de partos operatórios, porque intervenções desnecessárias são perigosas para mulheres e lactentes.

4.6. Posição Materna durante o Segundo Estágio

Vários estudos (Stewart et al 1983, Liddell e Fisher 1985, Chen et al 1987, Johnstone et al 1987, Gardosi et al 1989ab, Stewart e Spiby 1989, Crowley et al 1991, Allahbadia e Vaidya 1992, Bhardwaj et al 1995) sugerem que uma posição verticalizada ou uma inclinação lateral durante o segundo estágio do parto apresentam maiores vantagens do que uma posição dorsal. A posição verticalizada causa menos desconforto e dificuldade de puxos, menos dor durante o trabalho de parto, menos traumatismo vaginal ou perineal e infecções da incisão. Num estudo, observou-se uma menor duração do segundo estágio na posição verticalizada. Em relação ao resultado fetal, em alguns estudos houve menos escores de Apgar abaixo de 7 na posição verticalizada.

Uma posição verticalizada, com ou sem o uso de uma cadeira de parto, pode causar um maior número de lacerações dos lábios. Os resultados sugerem um aumento de lacerações de terceiro grau, embora os números disponíveis para análise sejam muito pequenos. Verificou-se uma maior porcentagem de hemorragia pós-parto em mulheres que adotaram posições verticalizadas. A causa disso ainda não foi determinada: possivelmente, na posição verticalizada, a estimativa da perda sanguínea é mais precisa, mas a diferença também poderia ser devida a uma maior pressão sobre as veias pélvicas e vulvares (Liddell e Fisher 1985, Gardosi et al 1989,Crowley et al 1991). Num estudo, o nível de hemoglobina no quarto dia de puerpério era menor, embora a diferença não fosse significativa.

Como no primeiro estágio, a posição da mãe durante o segundo estágio do trabalho de parto afeta a condição fetal. Pesquisas mostram uma menor freqüência de padrões anormais dos batimentos cardíacos fetais em posições verticalizadas, e um pH médio da artéria umbilical mais alto. Alguns estudos perguntaram às mulheres sua posição preferida, e verificaram um maior entusiasmo pelas posturas verticalizadas, que produziam menos dor e menos dor lombar. A posição de litotomia com as pernas em estribos era percebida como menos confortável e com mais dor e restrição de movimentos. Mulheres que tinham dado a luz nesta posição prefeririam ter a opção de uma posição verticalizada no futuro (Stewart e Spiby 1989, Waldenstrôm e Gottvall 1991).

Grande parte do efeito positivo das posições verticalizadas depende da capacidade do parteiro e de sua experiência com outras posições além do decúbito dorsal. Um certo grau de conhecimento sobre as vantagens e a disposição de fazer o parto de mulheres em diferentes posições pode fazer uma vasta diferença no trabalho de parto.

Em conclusão, tanto para o primeiro quanto para o segundo estágios, isto significa que as mulheres podem adotar qualquer posição que lhes agrade, preferivelmente evitando longos períodos em decúbito dorsal. Deve-se estimulá-las a experimentar aquilo que for mais confortável, e suas escolhas devem ser apoiadas. Os prestadores de serviço necessitam treinamento em como comandar e realizar partos em outras posições além da supina, a fim de não serem um fator inibidor na escolha de posições.

4.7. Cuidados com o Períneo

A lesão de períneo é um dos traumatismos mais freqüentes durante o parto, mesmo em trabalhos de parto e parto considerados normais. Existem várias técnicas e práticas que visam reduzir os danos, ou alterá-los para um grau manejável.

4.7.1. Proteção do Períneo Durante o Parto

Muitos livros descrevem a prática de proteção ao períneo durante o parto da cabeça: os dedos de uma das mãos (geralmente a direita) apóiam o períneo, enquanto ao outra mão faz uma leve pressão sobre a cabeça para controlar a velocidade de coroamento, tentando assim evitar ou reduzir os danos aos tecidos perineais. É possível que, com essa manobra, se evite uma laceração de períneo, mas também é concebível que a pressão sobre a cabeça fetal impeça o seu movimento de extensão e a afaste do arco púbico em direção ao períneo, aumentando assim a possibilidade de lesão perineal. Como não foi feita uma avaliação formal desta estratégia ou do seu inverso (não tocar o pólo cefálico ou o períneo durante esta fase do parto), é impossível determinar a estratégia preferível. A prática de proteção do períneo com as mãos do parteiro pode ser aplicada mais facilmente se a mulher estiver em decúbito dorsal. Se ela estiver numa posição verticalizada, o parteiro pode fazer o suporte ao períneo às cegas, ou ser forçado a seguir a estratégia de “não tocar”.

Outra técnica visando reduzir o risco de trauma ao períneo é massageá-lo durante a última parte de segundo estágio, tentando assim distender os tecidos. Esta técnica nunca foi avaliada adequadamente, mas podem haver dúvidas sobre o benefício de uma massagem continuada a tecidos que já são altamente vascularizados e estão edemaciados.

Outras manobras cuja eficácia não dispomos de evidências suficientes são os diferentes métodos para o desprendimento dos ombros e do abdômen, após o parto da cabeça. Não está claro se essas manobras são sempre necessárias e se são adequadas. Não existem pesquisas sobre esse assunto. Entretanto, a Unidade Nacional de Epidemiologia Perinatal em Oxford, Inglaterra, está atualmente realizando um estudo controlado randomizado de “Cuidado do Períneo no Parto-Manejo ou Espera” (Care of the Perineum at Delivery-Hands On Or Poised), o chamado estudo “HOOP”, que deve fornecer dados sobre o efeito de diferentes métodos de desprendimento no parto da cabeça e dos ombros do feto sobre o períneo (McCandlish 1996).

4.7.2. Laceração de períneo e episiotomia

A ocorrência de lacerações perineais é freqüente, especialmente em primíparas. Lacerações de primeiro grau às vezes nem necessitam sutura, lacerações de segundo grau em geral podem ser suturadas com facilidade sob analgesia local, em regra geral, cicatrizam sem complicações. As lacerações de terceiro grau podem ter conseqüências mais sérias e sempre que possível devem ser suturadas por um obstetra num hospital bem equipado, a fim de evitar problemas de fístula ou incontinência fecal.

A episiotomia é realizada com freqüência, mas sua incidência é variável. Nos Estados Unidos, são realizadas em 50 a 90% das primíparas, o que a torna o mais freqüente procedimento cirúrgico naquele país (Thacker e Banta 1983, Cunningham et al 1989, Woolley 1995). Muitos centros têm condutas “protetoras”, tais como a exigência que todas as primíparas sejam submetidas a episiotomia. Nos Países Baixos, as parteiras apresentam uma freqüência total de 24,5% de episiotomias, sendo 23,3% médio-laterais e 1,2% medianas (El e Heras 1995). As episiotomias medianas são suturadas com mais facilidade e têm a vantagem de deixar menos tecido cicatricial, enquanto as episiotomias mediolaterais evitam mais eficazmente o esfíncter anal e o reto. Sinais de sofrimento fetal; progressão insuficiente do parto; ameaça por laceração de terceiro grau (incluindo uma laceração de terceiro grau num parto anterior) podem ser bons motivos para realizar uma episiotomia num parto até então normal.

Todas as três indicações são válidas, embora seja muito difícil prever uma laceração de terceiro grau. A incidência destas últimas é de cerca de 0,4% portanto, o diagnóstico “ameaça de laceração de terceiro grau” somente deve ser feito ocasionalmente, ou diagnóstico perde o seu significado.

A literatura apresenta vários outros motivos para o uso liberal da episiotomia, incluindo o argumento que ela substitui uma laceração de bordos irregulares por uma incisão cirúrgica reta e limpa, mais fácil de suturar e de melhor cicatrizarão (Cunningham et al 1989); que o uso liberal da episiotomia evita traumatismos severos ao períneo; que a episiotomia evita traumatismos da cabeça fetal; e que evitam traumatismos da musculatura do assoalho pélvico, prevenindo portanto a incontinência urinária de estresse.

As evidências em favor desses supostos benefícios de um uso liberal da episiotomia foram investigadas em vários estudos randomizados (Sleep et al 1984, 1987, Hamson et al 1984, House et al 1986, estudo argentino de episiotomia 1993). Os dados desses estudos não fornecem indícios em favor desta prática. O uso liberal da episiotomia está associado a maiores taxas de traumatismo ao períneo e a menores taxas de mulheres com um períneo intacto. Os grupos de mulheres com uso liberal e uso limitado de episiotomia tiveram um grau comparável de dor perineal avaliada aos 10 dias e 3 meses após o parto. Não há indícios de um efeito protetor da episiotomia sobre a condição fetal. Num estudo de acompanhamento por até três anos após o parto, não se verificou nenhuma influência de um uso liberal da episiotomia sobre a incontinência urinária. Num estudo observacional de 56.471 partos realizados por enfermeiras- parteiras, a incidência de lacerações de terceiro grau foi 0,4% se não fosse feito nenhum tipo de episiotomia, e a mesma no caso de uma episiotomia mediolateral; a incidência com uma episiotomia mediana foi 1,2% (Pel e Heres 1995).

O prestador de serviços que faz a episiotomia deve ser capaz de suturar lacerações e episiotomias de modo adequado, e deve receber treinamento para isto. A episiotomia deve ser feita e suturada sob anestesia local, com as precauções adequadas para a prevenção de infecção pelo HIV e pelos vírus da hepatite (veja 2.8).

Em conclusão, não existem evidências confiáveis que o uso liberal ou rotineiro da episiotomia tenha um efeito benéfico, mas há evidências claras de que pode causar dano. Num parto até então normal, pode ocasionalmente haver uma indicação válida para uma episiotomia, mas recomenda-se o uso limitado dessa intervenção. A percentagem de episiotomias (10%) alcançada no estudo inglês sem dano para a mãe ou para o recém-nascido (Sleep et al 1984) seria uma boa meta a adotar.

5. ASSISTÊNCIA DURANTE O TERCEIRO ESTÁGIO DO PARTO

5.1. Antecendentes

Nesse estágio do trabalho de parto ocorre a separação e expulsão da placenta (dequitação); os principais riscos maternos são a hemorragia durante ou após essa separação e a retenção de restos placentares. A hemorragia pós-parto é uma das principais causas de mortalidade materna; a grande maioria desses casos ocorre em países em desenvolvimento (Kwast 1991). A incidência hemorragia pós-parto e de retenção de restos placentares aumentam em presença de fatores predisponentes, como gestação múltipla ou polidrâmnio e trabalho de parto complicado (distócia), correção da dinâmica do trabalho de parto, trabalho de parto obstruído, ou parto vaginal operatório (Gilbert et al 1987). A hemorragia pós-parto e a retenção de restos placentares também ocorrem com maior freqüência caso haja história prévia dessas complicações (Doran et al 1955, Hall et al 1987, OMS 1989). Até certo ponto, é possível selecionar, durante a gestação e no decorrer do trabalho de parto, as mulheres com um maior risco de complicações no terceiro estágio. Entretanto, mesmo em gestações de baixo risco e após um primeiro e segundo estágios sem problemas pode às vezes ocorrer hemorragia severa e/ou retenção placentária. O manejo do terceiro estágio pode influenciar a incidência e o volume da perda sanguínea. Várias medidas visando a prevenção dessas complicações foram propostas, testadas em estudos randomizados e são discutidas a seguir.

5.2. Uso Profilático de Ocitócitos

Pode-se fazer a administração profilática de ocitócitos em vários momentos durante o terceiro estágio. Mais freqüentemente, esta administração é intramuscular, imediatamente após o desprendimento do ombro anterior, ou após o nascimento do bebê. As drogas usualmente administradas e que foram investigadas em estudos, são a ocitocina e derivados do ergot, como a ergometrina, ou uma combinação de ambos, a sintometrina (Daley 1951, McGinty 1956, Friedman 1957, Newton et al 1961, Howard et al 1964, Hacker e Biggs 1979, Rooney et al 1985, Prendiville et al 1988, Thornton et al 1988, Begley 1990). Tanto a ocitocina quanto os derivados de ergot diminuem a perda sanguínea pós-parto estimada, mas o efeito do ergot parece ser um pouco menor do que o da ocitocina. O efeito sobre a retenção de restos placentares ainda não está bem claro, embora alguns dados sugiram que a administração rotineira de ocitócitos possa aumentar esse risco.

As complicações dos ocitócitos são náusea, vômitos, cefaléia e hipertensão pós-parto. Essas complicações ocorrem mais freqüentemente com os derivados do ergot. Além disso, problemas maternos raros porém sérios têm sido associados aos ocitócitos, especialmente a ergometrina: parada cardíaca e hemorragia intracerebral, infarto do miocárdio, eclampsia pós-parto e edema pulmonar. Devido à sua raridade, estudos randomizados não podem fornecer informações úteis sobre o grau com que podem ser atribuídos aos ocitócitos. Os indícios disponíveis sugerem que a ocitocina é uma melhor escolha do que os derivados de ergot. Além disso, em países tropicais, a ocitocina é mais estável do que a ergometrina ou a metilergometrina (Hogerzeil et al 1992,1994).

Como em muitos países em desenvolvimento a administração de comprimidos por via oral seria muito mais fácil, e, em condições tropicais, os comprimidos seriam mais estáveis do que medicações injetáveis, realizou-se um estudo randomizado para investigar a influência de comprimidos orais de ergometrina imediatamente após o nascimento. O resultado foi desapontante: comparado a um placebo, o efeito demonstrável da medicação sobre a perda sanguínea após o nascimento era pequeno (De Groot et al 1996).

5.3. Tração Controlada do Cordão

A tração controlada do cordão envolve a tração do cordão, combinada com contrapressão sobre o corpo uterino na direção cefálica, feita por uma mão colocada imediatamente acima da sínfise púbica. Em dois estudos controlados, comparou-se esse procedimento a abordagem menos ativa, às vezes envolvendo pressão fúndica (Bonham 1963, Kemp 1971). Nos grupos de tração controlada, demonstraram-se uma menor perda sanguínea média e um terceiro estágio mais curto, mas os estudos não fornecem dados suficientes para justificar conclusões definitivas sobre a ocorrência de hemorragias pós-parto e a remoção manual da placenta. Num dos estudos, a paciente tinha menos desconforto com o uso da tração controlada. Entretanto, em 3% havia ruptura do cordão durante a sua tração controlada. Uma complicação rara mas séria associada à tração controlada do cordão é a inversão uterina. Mesmo que a associação possa estar relacionada a uma má aplicação do método, a ocorrência de inversão uterina causa preocupação. Nos estudos acima mencionados, aparentemente os dados foram coletados de mulheres em posição supina A impressão de parteiras em partos com a mulher em posições verticalizadas durante o, segundo e terceiro estágios é que o terceiro estágio é mais curto e a dequitação da placenta e mais fácil, embora a perda sanguínea seja maior do que no decúbito. Entretanto, com exceção da perda sanguínea, esses aspectos não foram investigados em estudos randomizados.

Presumivelmente, seria mais difícil realizar a tração controlada do cordão, conforme descrita nos textos, em posição vertical.

5.4. Comparação entre os Manejos Ativo e Expectante do terceiro Estágio

Os efeitos combinados do uso de ocitócitos e tração controlada do cordão são às vezes condensados no termo “manejo ativo do terceiro estágio”, em contraste com o manejo expectante ou fisiológico. Às vezes o clampeamento precoce do cordão também está incluído, especialmente por ser obrigatório no caso de tração controlada do cordão. Entretanto, como os principais efeitos deste procedimento envolvem o recém-nascido, examinaremos aquele aspecto separadamente.

Na literatura o manejo ativo do terceiro estágio compara-se favoravelmente ao manejo expectante, principalmente porque a hemorragia pós-parto é menos freqüente e os níveis de hemoglobina no puerpério são mais altos (Prendiville et al 1988, Harding et al 1989, Begley 1990, Thigalathan et al 1993). Os resultados dos dois maiores estudos, em Bristol e Dublin, em relação à freqüência de transfusão sanguínea e de remoção manual da placenta não são idênticos (Prendiville et al 1988, Begley 1990). Em ambos os estudos, o manejo ativo resultou em mais náuseas, vômitos e hipertensão, provavelmente causadas pelo uso da ergometrina.

Algumas observações sobre esses achados podem ser justificadas. A OMS define hemorragia pós-parto como uma perda sanguínea = 500ml (OMS 1990). O diagnóstico é feito por uma estimativa clínica da perda sanguínea; esse tipo de avaliação do volume sanguíneo freqüentemente leva a um grau significativo de subestimativa. Aparentemente, a definição e influenciada pelo fato que, em muitas partes do globo, uma perda de 500ml (ou ate menos) e ; uma real ameaça à vida de muitas mulheres, principalmente devido à alta prevalência de anemia severa Mesmo assim, se medida meticulosamente, a perda sanguínea média num parto vaginal, é de aproximadamente 500ml, e cerca de 5 das mulheres com parto vaginal perdem mais de, 1000 ml de sangue (Pritchard et al 1992, Newton 1966, De Leeuw et al 1968, Letsky 1991). No estudo de Bristol (Prendiville et al 1988), 18 do grupo de mulheres com um manejo fisiológico do terceiro estágio tiveram perdas sanguíneas > 500ml, e apenas 3 perderam >1000ml.

Numa população saudável (como no caso da maioria dos países desenvolvidos), uma perda sanguínea pós-parto de até 1000 ml pode ser considerada fisiológica, e não necessita outro tratamento além de ocitócitos. Entretanto, em muitos países em desenvolvimento, podem-se aplicar outros padrões. O limite de 500ml definido pela OMS deve ser considerado uma curva de alerta; a curva de ação é atingida quando há ameaça para as funções vitais da mulher.Em mulheres saudáveis, isso geralmente ocorre quando a perda sanguínea é maior do que 1000 ml.

A distinção é crucial, tendo em vista os esforços para minimizar transfusões sanguíneas desnecessárias e os riscos a elas associados, incluindo a infecção pelo HIV.

Ainda não é possível chegar a conclusões precisas sobre o valor do manejo ativo no terceiro estágio em populações saudáveis de baixo risco. O termo “manejo ativo” e utilizado para combinações de diferentes intervenções com diferentes efeitos e paraefeitos. Todos os estudos da comparação entre manejo expectante e manejo ativo foram realizadas em centros onde o manejo ativo era prática normal. É necessário estudar essa comparação onde os dois tipos de manejo sejam procedimentos normais. A ocorrência de complicações raras, mas sérias (complicações cardíacas, eclâmpsia, inversão uterina, etc.) não pode ser estudadas em estudos randomizados, mas pode, mesmo assim, ter grande importância se e quando o manejo ativo for recomendado para grandes populações. Existem fundamentos para sérias duvidas sobre o uso profilático de ergometrina ou de uma combinação de ocitocina e ergometrina e também sobre a tração controlada do cordão como procedimentos de rotina.

Em conclusão, a administração de ocitocina imediatamente após o desprendimento do ombro anterior, ou o nascimento do bebê, parece apresentar vantagens, especialmente em mulheres com um maior risco de hemorragia pós-parto ou em mulheres para quem a perda de até mesmo um pequeno volume sanguíneo constitui um perigo, como por exemplo mulheres com anemia severa. Existem dúvidas sobre sua combinação com a tração controlada do cordão, e sua aplicação rotineira a mulheres saudáveis de baixo risco. A recomendação desta norma implicaria que os benefícios desse manejo compensariam e até ultrapassaria seus riscos potencialmente raros mas sérios que podem se manifestar futuramente. Em nossa opinião,é muito cedo para recomendar esta forma de manejo ativo do terceiro estágio para todos os partos normais de baixo risco, embora observemos as recomendações anteriores da OMS (1990, 1994c). Caso, por diferentes motivos, se utilize o manejo ativo, vários pontos permanecem não resolvidos, particularmente quanto ao momento ideal para injeções profiláticas de ocitocina.

5.5. Momento para o Clampeamento do Cordão

O cordão umbilical pode ser clampeado imediatamente após o parto ou mais tarde, e isso pode ter efeitos sobre a mãe e a criança (Prendiville e Elboume 1989). Alguns estudos investigaram os efeitos desse procedimento (Dunn et al 1966, Botha 1968, Nelson et al 1980). Não se verificaram indícios de um efeito significativo do momento do clampeamento sobre a incidência de hemorragia pós-parto ou sobre a transfusão feto-materna. Os efeitos sobre o recém-nascido foram estudados em estudos observacionais e testes randomizados.

Existem várias observações sobre os efeitos do clampeamento do cordão sobre o récem-nascido (Buckeis e Usher 1965, Spears et al 1966, Yao et al 1971, Nelson al 1980) Se depois do nascimento, o recém-nascido for colocado no nível da vulva ou abaixo dele por três minutos há uma transferência de aproximadamente 80 ml de sangue da placenta para o recém-nascido (Yao et al 1971, 1974, Dunn 1985) Os eritrócitos nesse volume de sangue logo serão hemolisados, mais isso fornece cerca de 50 mg de ferro para as reservas do lactente e reduz a freqüência de anemia ferropriva no primeiro ano de vida (Michaelsen et al 1995, Pisacane 1996). Teoricamente, essa transfusão de sangue da placenta para o recém-nascido pode causar hipervolemia, policitemia e hiperviscosidade, além de hiperbilirrubinemia. Esses efeitos foram investigados em vários estudos (Prendville e Elbourne 1989). Os bebês que têm clampeamento precoce do cordão têm valores mais baixos de hemoglobina e hematócrito. No que se refere a distúrbios respiratórios neonatais, não houve diferenças significativas entre as duas condutas. Os níveis neonatais de bilirrubina eram menores após o clampeamento precoce do cordão, mas não foram observadas diferenças clinicamente relevantes entre as duas condutas, e nenhuma diferença em morbidade neonatal.

O clampeamento tardio (ou ausência de clampeamento) é o modo fisiológico de tratar o cordão, e o clampeamento precoce é uma intervenção que deve ter motivos. A “transfusão” de sangue para a placenta para o recém-nascido, se o cordão for clampeado tardiamente, é fisiológica, e é improvável que tenha efeitos adversos, pelo menos em casos normais. Após uma gestação ou parto anormais, como por exemplo no caso de sensibilização de RH ou parto prematuro,o clampeamento tardio pode causar complicações, porém, no parto normal, deveria existir uma razão válida para uma interferência com o procedimento natural.

Caso se faça a tração controlada do cordão após a administração de ocitocina, como em muitos departamentos de obstetrícia em todo o mundo, o clampeamento precoce ou relativamente precoce do cordão é obrigatório. Entretanto, nos locais onde se ensina e pratica o clampeamento tardio, isto é, depois de cassada a pulsação do cordão, em geral após cerca de 3- 4 minutos, não se registraram efeitos adversos. Além disso, pesquisas recentes apóiam o clampeamento tardio, porque pode evitar a anemia ferropriva na infância, o que pode ser especialmente importante em países em desenvolvimento (Michaelsen et al 1995, Pisacane 1996). Embora atualmente não existam indícios suficientes para decidir em favor do clampeamento precoce ou tardio, este assunto claramente merece mais atenção.

5.6. Cuidados Imediatos do Recém-Nascido

Imediatamente após o nascimento, deve-se verificar o estado do recém-nascido. Isto é uma parte integral da assistência ao parto normal, e a Organização Mundial da Saúde enfatiza a importância de uma abordagem unificada à assistência materna e neonatal (OMS 1994c). Os cuidados imediatos consistem em verificar a permeabilidade das vias aéreas, tomar providências para a manutenção da temperatura corporal, clampear e cortar o cordão e colocar o bebê ao seio o mais cedo possível. Cada um desses pontos foi alvo de um considerável volume de pesquisas e debates, mas este Grupo Técnico de Trabalho sobre o Parto Normal tem a vantagem de poder consultar o trabalho e recomendações do Grupo Técnico de Trabalho sobre a Assistência Essencial ao Recém-Nascido (OMS 1996). O presente documento menciona brevemente apenas alguns aspectos dos cuidados imediatos do recém-nascido.

Imediatamente após o nascimento, o bebê deve ser seco com compressas ou toalhas quentes, enquanto é colocado sobre o abdômen ou nos braços da mãe. Ao mesmo tempo, avalia-se o estado do bebê e verifica-se a permeabilidade da via aérea (se necessário). É importante manter a temperatura corporal do bebê; recém-nascidos expostos a salas de parto frias podem sofrer quedas acentuadas de temperatura, com os problemas metabólicos decorrentes. O contato pele-a-pele entre a mãe e o bebê pode fazer com que a queda da temperatura do bebê não seja tão intensa.

–O contato pele-a-pele precoce entre a mãe e o bebê é importante por várias outras razões. Psicologicamente, estimula a mãe e o bebê a se conhecerem. Após o parto, os bebês são colonizados por microorganismos; é melhor que entrem em contato com a flora cutânea de suas mães, e não sejam colonizados por bactérias de prestadores de serviços ou de um hospital. Todas essas vantagens são difíceis de comprovar, mas mesmo assim parecem plausíveis. Deve-se estimular a sucção/aleitamento precoces, na primeira hora após o nascimento (OMS/UNICEF 1989). A influência da estimulação do mamilo pelo bebê sobre as contrações uterinas e a perda sanguínea pós-parto deve ser investigada. Já existe um estudo randomizado (Bullough et al 1990), mas envolvendo somente parteiras tradicionais, e não foi possível determinar a influência da sucção precoce sobre a perda sanguínea. Entretanto, é necessário um estudo com profissionais de assistência obstétrica.
–O corte do cordão deve ser feito com instrumentos estéreis, que sejam descartáveis, como por exemplo os do kit de parto, ou meticulosamente descontaminados por esterilização. Isto é fundamental para a prevenção de infecções.

5.7. Cuidados da Mãe Imediatamente Após a Dequitação da Placenta

Deve-se examinar minuciosamente a placenta, a fim de detectar anormalidades (infartos, hematomas, inserção anormal do cordão umbilical), mas principalmente pra verificar sua integridade. Se houver suspeita de dequitação incompleta (retenção de restos placentários), devem-se tomar providências para a exploração da cavidade uterina. Se pequenas partes das membranas estiverem faltando, a exploração uterina não é necessária.

Em alguns países, os parteiros exploram rotineiramente a cavidade uterina após todos os partos, a chamada “revisão uterina”. Não existe o menor indício que esta política seja útil; ao contrário, pode causar infecção ou traumatismo mecânico, ou até mesmo choque. O mesmo se aplica a outra prática, a “lavagem do útero”, o enxágüe ou aplicação de duchas na cavidade uterina após o parto.

A mulher deve ser observada cuidadosamente durante a primeira hora após o parto. As observações mais importantes incluem o volume da perda sanguínea e a altura do fundo uterino: se a contratilidade uterina for insuficiente, pode haver acúmulo de sangue na cavidade. Se a perda sanguínea for anormal e a contração do útero for fraca, uma massagem abdominal leve sobre o útero pode ser útil. É essencial assegurar que uma bexiga cheia não está inibindo a contração uterina. Uma perda sanguínea anormal, estimada em mais de 500 ml, deve ser tratada com ocitócitos: ergometrina ou ocitocina por via intramuscular. O estado da mãe também é importante: deve-se avaliar a pressão arterial, freqüência cardíaca e temperatura e o seu bem-estar geral.

6. CLASSIFICAÇÃO DE PRÁTICAS NO PARTO NORMAL

Este capítulo classifica as práticas comuns na condução do parto normal em quatro categorias. Dependendo de sua utilidade, eficácia e ausência de periculosidade. A classificação reflete opiniões do Grupo Técnico de Trabalho sobre o Parto Normal. Não apresentamos aqui argumentos em favor desta classificação; o leitor deve consultar os capítulos anteriores, que soa o resultado da reflexão e dos debates do Grupo de Trabalho, baseados na melhoro evidência atualmente disponível (o número do capítulo é apresentado entre parênteses).

6.1. Práticas que são Demonstradamente Úteis e que Devem ser Estimuladas

1.Plano individual determinando onde e por quem o parto será realizado, feito em conjunto com a mulher durante a gestação, e comunicado a seu marido/ companheiro e, se aplicável, a sua família (1.3).
2.Avaliação do risco gestacional durante o pré-natal, reavaliado a cada contato com o sistema de saúde e no momento do primeiro contato com o prestador de serviços durante o trabalho de parto e parto (1.3)
3.Monitorar o bem-estar físico e emocional da mulher ao longo do trabalho de parto e parto, assim como ao término do processo do nascimento (2.1).
4.Oferecer líquidos por via oral durante o trabalho de parto e parto (2.3).
5.Respeitar a escolha da mãe sobre o local do parto, após ter recebido informações (2.4).
6.Fornecimento de assistência obstétrica no nível mais periférico onde o parto for viável e seguro e onde a mulher se sentir segura e confiante (2.4 e 2.5).
7.Respeito ao direito da mulher à privacidade no local do parto (2.5).
8.Apoio empático pelos prestadores de serviço durante o trabalho de parto e parto (2.5).
9.Respeito à escolha da mulher quanto ao acompanhante durante o trabalho de parto e parto (2.5).
10.Fornecer às mulheres todas as informações e explicações que desejarem (2.5).
11. Métodos não invasivos e não farmacológicos para alívio da dor, como massagem e técnicas de relaxamento, durante o trabalho de parto (2.6).
12.Monitoramento fetal por meio de ausculta intermitente (2.7).
13.Uso de materiais descartáveis apenas uma vez e descontaminação adequada de materiais reutilizáveis durante todo o trabalho de parto e parto (2.8).
14.Usar luvas no exame vaginal, durante o nascimento do bebê e na dequitação da placenta (2.8).
15.Liberdade de posição e movimento durante o trabalho do parto (3.2).
16.Estímulo a posições não supinas (deitadas) durante o trabalho de parto e parto (3.2 e 4.6).
17.Monitoramento cuidadoso do progresso do trabalho de parto, por exemplo pelo uso do partograma da OMS (3.4).
18.Utilizar ocitocina profilática na terceira fase do trabalho de parto em mulheres com um risco de hemorragia pós-parto, ou que correm perigo em conseqüência de uma pequena perda de sangue (5.2 e 5.4).
19.Condições estéreis ao cortar o cordão (5.6).
20.Prevenir hipotermia do bebê (5.6).
21.Contato cutâneo direto precoce entre mãe e filho e apoio ao início da amamentação na primeira hora do pós-parto, conforme diretrizes da OMS sobre o aleitamento materno (5.6)
22.Examinar rotineiramente a placenta e as membranas ovulares (5.7).

6.2. Práticas Claramente Prejudiciais ou Ineficazes e que devem ser Eliminadas

1.Uso rotineiro de enema (2.2).
2.Uso rotineiro de tricotomia (2.2).
3.Infusão intravenosa rotineira em trabalho de parto (2.3).
4.Cateterização venosa profilática de rotina (2.3).
5.Uso rotineiro da posição supina durante o trabalho de parto (3.2 e 4.6).
6.Exame retal (3.3).
7.Uso de pelvimetria por raios-X (3.4).
8.Administração de ocitócicos em qualquer momento antes do parto de um modo que não permita controlar seus efeitos (3.5)
9.Uso rotineiro da posição de litotomia com ou sem estribos durante o trabalho de parto e parto (4.6).
10.Esforços de puxo prolongados e dirigidos (manobra de Valsalva) durante o segundo estágio do trabalho de parto (4.4).
11.Massagens e distensão do períneo durante o segundo estágio do trabalho de parto (4.7)
12.Uso de comprimidos orais de ergometrina na dequitação para prevenir ou controlar hemorragias (5.2 e 5.4).
13.Uso rotineiro de ergometrina por via parenteral no terceiro estágio do trabalho de parto (5.2).
14.Lavagem rotineira do útero depois do parto (5.7).
15.Revisão rotineira (exploração manual) do útero depois do parto (5.7)

6.3. Práticas em Relação às quais Não Existem Evidências Suficientes para Apoiar uma Recomendação Clara e que devem Ser Utilizadas com Cautela até que Mais Pesquisas Esclareçam a Questão

1.Método não farmacológico de alívio da dor durante o trabalho de parto, como ervas, imersão em água e estimulação nervos (2.6).
2.Amniotomia precoce de rotina (romper a bolsa d’água) no primeiro estágio do trabalho de parto (3.5).
3.Pressão no fundo uterino durante o trabalho de parto e parto (4.4).
4.Manobras relacionadas à proteção ao períneo e ao manejo do pólo cefálico no momento do parto (4.7)
5.Manipulação ativa do feto no momento de nascimento (4.7).
6.Uso rotineiro de ocitocina, tração controlada do cordão ou sua combinação durante o terceiro estágio do trabalho de parto (5.2; 5.3 e 5.4)
7.Clampeamento precoce do cordão umbilical (5.5).
8.Estimulação do mamilo para aumentar contrações uterinas durante o terceiro estágio do parto-dequitação (5.6).

6.4. Práticas Freqüentemente Utilizadas de Modo Inadequado

1.Restrição hídrica e alimentar durante o trabalho de parto (2.3).
2.Controle da dor por agentes sistêmicos (2.3)
3.Controle da dor por analgesia peridural (2.6)
4.Monitoramento eletrônico fetal (2.7)
5.Utilização de máscaras e aventais estéreis durante a assistência ao parto (2.8)
6.Exames vaginais repetidos e freqüentes, especialmente por mais de um prestador de serviços (3.3).
7.Correção da dinâmica com a utilização de ocitocina (3.5)
8.Transferência rotineira da parturiente para outra sala no início do segundo estágio do trabalho de parto (4.2).
9.Cateterização da bexiga (4.3).
10.Estímulo para o puxo quando se diagnostica dilatação cervical completa ou quase completa, antes que a própria mulher sinta o puxo involuntário (4.3)
11.Adesão rígida a uma duração estipulada do segundo estágio do trabalho de parto, como por exemplo uma hora, se as condições maternas e do feto forem boas e se houver progresso do trabalho de parto (4.5)
12.Parto operatório (4.5).
13.Uso liberal ou rotineiro de episiotomia (4.7)
14.Exploração manual do útero depois do parto (5.7)

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THE COCHRANE PREGNANCY and CHILDBIRTH DATABASE (issue 1995-1)
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-Prophylactic oxytocics in third stage of labour. Review 02974
-Prophylactic syntometrine vs oxutocin in third stage of labour. Review 03000
-Prophylactic oxytocin vs ergot derivatives in the third stage f labour. Review 03001
-Early umbilical cord clamping in third stage of labour. Reviwe 3818
-Coord traction vs fundal pressure in third stage of labour. Review 03004
-Active vs conservative third stage management -low risk women. Review 05353

Fraser WD

-Amniotomy to shorten spontaneous labour. Review 04134
-Early amniotomy and early oxytocin for delay in labour compared to routine care. Review 06949

Grant AM

-EFM vs intermittent auscultation in labour. Reviwe 03884
-EFM and scalp sampling vs intermittent auscultation in labour. Review 03297
-EFM alone vs intermittent auscultation labour. Review 003298
-Fetal blood sampling as adjunct to heart rate monitoring. Review 07018
-Liberal vs restricted use of EFM in labour (low risk labours). Review 03886
-Liberal vs restricted use of EFM in labour (all labours). Review 07672.

Hodnett ED

-Support from caregives duting childbirth. Review 03871
-Birth room vs conventional delivery setting. Review 05735
-Continuity of caregives during pregnancy and childbirth. Reviwe 07672.

Howeel CJ

-Transcutaneous nerve stimulation (TENS) in labour. Review 05253.
-Transcutaneous nerve stimulation (TENS) vs pethidine in labour. Review 05254.
-Systematic narcotics for analgesia in labour. Review 03398.
-Diazepam in labour. Review 03401.
-Methoxyflurane vs notrous oxide/oxygen for analgesia in labour. Review 03400.
-Epidural vs non-epidural analgesia in labour. Review 03399.

Nikodem C

-Upright vs recumbent position during first stage of labour. Review 03334.
-Upright vs recumbent position for second stage of labour. Review 03335.
-Birth Chair vs recumbent position for second stage of labour. Review 04735.
-Lateral tilt vs dorsal position for second stage of labour. Review 03402.
-Sustained (Valsalva) vs exhalatory bearing down in second stage of labour. Review 03336.

Renfrew MJ

-Routine perineal shaving on admission in labor. Review 03876.
-Liberal use of episiotomy for spontaneous vaginal delivery. Review 03695.

Renfrew MJ, Hay-Smith J

-Routine enema on admission in labor. Review 03877.

Sinclair JC

-Intubation and suction in vigorous meconium –stained babies. Review 05946.

Reconhece-se de modo especial as seguintes publicações freqüentemente mencionadas:

Chalmers I, Enkin M, Keirse MJNC (eds). Effective care in pregnancy and childbirth. Oxford, Oxford University Press 1989.

Enkin M, Keirse MJNC, Renfrew MJ, Neilson J. A Guide to Effective care in pregnancy and childbirth, 2nd ed. Oxford, Oxford University Press 1995

Este documento não é uma publicação formal da Organização Mundial de Saúde (OMS).
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