Caroline Gurgel – nascimento do Pedro
Dia 27 de dezembro de 2003, às 00 hs e 15 min
Em 2000 engravidei da Luana, tinha apenas 20 anos e definitivamente não foi uma gravidez planejada, embora posteriormente tenha sido muito bem vinda e desejada. No dia 03 de fevereiro de 2001 a minha filha nasceu não porque era a sua hora, mas porque foi a hora determinada pelo meu médico sei lá por que razões! A Luana veio ao mundo por uma cesárea com hora marcada, com 38 semanas, o que lhe rendeu um desconforto respiratório, sete dias de UTI e uma infinidade de frustrações. A primeira vez que vi minha filha foi sentada em uma cadeira de rodas, através de um vidro, lutando contra a dor do meu corte para arrumar uma posição melhor em que eu pudesse pelo menos ver uma parte de seu rostinho. Amamentei somente após cinco infinitos dias, tive uma recuperação péssima, tanto fisicamente como emocionalmente.
Em seus primeiros dias de vida a Luana ficou na frieza de uma incubadora, sem um colo quentinho, sem o cheiro de leite, sem todo amor que eu tinha para dar. Nada se compara a dor de ver um filho tão esperado isolado, abandonado, cheio de fios e aparelhos… O trauma foi tamanho que decidi que não mais teria filhos, jamais passaria por tanto sofrimento novamente, foram dois anos guardando essa mágoa. Mas o tempo foi passando, a Luana foi crescendo cada dia mais linda e meu instinto materno começou a aflorar novamente, seria muito egoísmo meu deixar minha filha crescer sozinha por medo de sofrer novamente, descobri enfim que a covardia definitivamente não é mais um de meus inúmeros defeitos.
Em março de 2003, na primeira tentativa engravidei novamente, era o Pedro que estava a caminho. Logo que soube da gravidez decidi que dessa vez seria diferente, não deixaria ninguém escolher à hora do meu filho nascer, queria muito ter um parto normal, mas essa idéia ainda era muito mal elaborada na minha cabeça: Poderia eu ter um parto normal após uma cesárea?
Foi um dia passeando com a minha filha que descobri a resposta. Nesse dia encontrei a Analy, a mãe de um amiguinho da Luana, com um bebezinho no colo, perguntando do parto me surpreendi ao saber que havia sido um parto normal e que ela já havia se submetido a uma cesárea com seu primeiro filho. Para meu espanto maior descobri que o parto foi em casa… “Não deu tempo de chegar da maternidade?”. Não, foi uma opção que a primeira vista me pareceu maluca, mas que me fez descobrir que eu também era capaz. Foi nesse dia que conheci as amigas do parto, que mudou todo o destino desse relato e foi fundamental para que essa história tivesse um final feliz.
Entrei no site e descobri uma infinidade de coisas que nunca tinha sequer ouvido falar, VBAC, sala de parto, parto humanizado, episiotomia, todas essas palavras até então para mim não diziam nada. Conheci a Ana Cris em um piquenique organizado pela lista materna. Foi nesse dia que começou toda minha “lavagem cerebral”. Ela foi bem clara naquele dia, se eu quisesse um parto natural teria que procurar um médico com essa conduta, caso contrário cairia novamente no conto do vigário. Resisti até o dia em que a minha ex médica me disse que se eu quisesse um parto normal ela teria que usar o fórceps por causa da minha cesárea. Sai daquela consulta decidida a nunca mais voltar lá, eu estava com 26 semanas de gravidez.
Foi através da Ana Cris que conheci o Dr. Marcos Tadeu Garcia. Logo na primeira consulta já tinha decidido, ele faria o meu parto. Nunca um médico tinha sido tão atencioso, compreensivo, paciente. Ele esclareceu todas as minhas dúvidas, finalmente estava ouvindo coisas compatíveis com o que eu sabia ser o correto após alguns meses de pesquisa. Naquele dia foi criada uma relação de confiança que me guiou durante o restante do meu pré-natal e que se fortaleceu imensamente no dia do meu parto. Nesse dia percebi que as coisas estavam começando a dar certo, que finalmente eu tinha encontrado o caminho para conquistar o meu tão sonhado VBAC!
As semanas foram passando e meu corpo não dava nenhum sinal de que à hora estava chegando, 40 semanas e nada, 41 semanas e nada. Nessa hora comecei a ficar desanimada, com medo de uma cesárea por causa de um eventual sofrimento fetal. Eram exames de dois em dois dias que me deixavam estressada e muito ansiosa. Falava para o meu marido que meu corpo não tinha ocitocina, que eu não conseguiria e ele sempre me incentivava, tentava me manter animada, otimista, como sempre foi meu porto seguro.
Dia 24 de dezembro pela manhã acordo com uma mancha de sangue na calcinha, finalmente algum sinal havia aparecido, seria aquele o tão famoso tampão? Fiquei empolgada, mas as contrações tão esperadas não davam nem sinal de vida.
Na noite de natal, às 23 horas, finalmente elas chegaram, mal podia me conter de tanta euforia, felicidade, seria aquele o meu dia? A cada contração era uma alegria. O Ricardo estava de plantão, decidi que só ligaria para ele ao amanhecer, mas a felicidade era tamanha que eu tinha que dividir com ele, meu companheiro, liguei para ele as três da manhã “Mor, volta pra casa que o Pedrinho vai nascer” (ai como eu sonhava em dizer essa frase!!!). O Ric chegou às quatro horas, estava tão nervoso que se perdeu no caminho. Decidimos que deveríamos descansar, pois teríamos uma luta e tanto pela frente! Obviamente não consegui dormir, seria pedir demais esperar 41 semanas e 4 dias e finalmente quando chegasse a hora ignorar o fato e descansar!! Ora bolas, eu queria curtir cada segundo, cada contração!!<
O Ric fez um toque em mim logo pela manhã (ele é médico) e constatou que eu estava com o colo trabalhado, mas com apenas um centímetro de dilatação. Para quem havia chego nas 41 semanas com o colo fechado e grosso era um grande avanço!!
Às sete horas da manhã as contrações começaram a ficar mais fortes, decidimos ir para casa (eu tinha dormido na casa da minha mãe) e ligar para o Dr. Marcos. Tomei um banho enquanto o Ric ligava. O Dr. Marcos disse que provavelmente estava na fase latente e que demoraria ainda algum tempo, mas como eu tinha exames marcados na Pro Matre me orientou a fazer os exames e pedir para uma obstetriz me avaliar.
Chegamos na Pro Matre as nove horas da manhã, fui examinada pela obstetriz, que foi super atenciosa. Estava com o colo trabalhado e com 2 centímetros de dilatação. O Dr. Marcos nos mandou de volta para casa, ainda era muito cedo para internar. Nessa hora fiquei desanimada, parecia que a internação era a confirmação do trabalho de parto, tinha medo de voltar pra casa e parar tudo! Ficamos ainda algum tempo na maternidade para fazer os exames. A cena era hilária, eu na recepção com minhas contrações, me contorcendo, agachando e todo mundo me olhando, principalmente aquelas mulheres que estavam se internando para a cesárea, que eram muitas, afinal era dia 26 de dezembro, após o natal e antes do ano novo se é que vocês me entendem!!
Quando terminamos os exames já era hora do almoço, resolvemos ir comer no Outback, que é nosso restaurante preferido. Loucura eu lá com minhas contrações no meio do restaurante, as pessoas sem entender nada e eu me divertindo com a situação. Acabamos de almoçar e resolvemos ir para casa, mas no caminho as contrações estavam muito mais fortes e eu decidi voltar para a maternidade, não queria ficar nesse vai não vai, liguei para o Dr. Marcos e disse que queria ser internada mesmo se o TP ainda não tivesse evoluído porque já estava com muitas dores e com medo de ficar em casa.
Chegamos à Pro Matre às três da tarde, fui examinada e estava com três centímetros de dilatação, às quatro horas fui internada. Ao entrar na LDR fiquei muito emocionada, como eu havia sonhado com aquele momento, mal podia acreditar que em breve estaria com o Pedro nos meus braços, mal podia acreditar que finalmente eu estava sentindo as dores do parto que até então estavam até que “prazerosas”! O Dr. Marcos chegou logo em seguida e para meu desânimo disse que as coisas ainda demorariam, o Pedro só nasceria no dia seguinte. Oras, eu havia gostado tanto do dia 26 de dezembro!!!
Às quatro horas da tarde o Dr. Marcos me examinou ainda três de dilatação, ainda pelo toque e pelo ultra-som que eu havia feito parecia que o Pedro estava com o dorso posterior (OS), o que dificultaria a evolução do TP. Nesse momento começamos a tentar diversas posições que ajudassem a mudar a posição do bebê, fiquei agachada, de quatro, sentada, só faltou virar de ponta cabeça. Nessa altura as contrações haviam se intensificado e estavam muito dolorosas. Dezoito horas outro exame e para meu desânimo ainda nos três centímetros. Eu morrendo de dor e as coisas não evoluíam. Segundo o Dr. Marcos era a posição do Pedro que estava dificultando.
Fui para o chuveiro, ainda era cedo para usar a banheira, que poderia retardar ainda mais o TP. Fiquei uma hora na água, com contrações muito intensas e com muita dor. Não conseguia ficar de pé durante as contrações, já estava muito cansada e com medo da tal da posição do bebê!! Às 20 horas saí do chuveiro e fiz outro exame, quatro centímetros. Desabei, seis horas de internação e evolução de apenas um centímetro! Estava estafada, já eram 20 horas de trabalho de parto com uma evolução muito lenta e dolorida.
O Dr. Marcos me explicava que aquilo estava acontecendo pela posição do bebê, minhas contrações estavam boas, mas a dilatação não avançava. O Dr. Marcos e o Ricardo me incentivaram o tempo todo, tentavam me manter animada, mas estava difícil, o cansaço estava me dominando e eu comecei a perder o controle. 21 horas, novo exame e de novo quatro centímetros de dilatação. Meu mundo desabou, eu não suportava mais, pedi anestesia, minhas esperanças estavam se acabando. Aliás, o nome da minha obstetriz era Esperança, lindo não?? Resolvi pensar que aquele era um sinal de que as coisas no final dariam certas!
O Dr. Marcos me explicou que a analgesia àquela altura poderia atrapalhar todo o processo, que melhor seria esperar mais um pouco, como sempre ele estava certo! Resolvemos tentar a banheira para relaxar, essa foi a minha glória! Finalmente consegui recuperar o controle da minha dor e passei a controlá-la melhor, fiquei na banheira por quase duas horas, aquela seria a minha chance de relaxar e deixar o meu corpo trabalhar. As dores estavam me deixando travada e isso dificultava o TP!
Às 23 horas o cansaço me dominava por inteiro, eram 24 horas de um lento TP, com contrações muito fortes e pouca evolução. Não suportaria mais aquela dor, ainda mais sem perspectiva como eu estava. Como as coisas estavam indo o Pedro só nasceria no dia 27 de manhã e isso acabava com a minha coragem. Digo que não fui vencida pela dor, mas sim pelo cansaço. Implorei ao Dr. Marcos que chamasse o anestesista, achava que iria morrer se ficasse mais um minuto com aquela dor, ainda mais sabendo que ela não estava sendo suficiente para o TP. Saí da banheira e com um novo exame foi constatado seis centímetros de dilatação. Fiquei animada, finalmente as coisa evoluíram um pouco!
Tomei anestesia as 23:45 hs, não sei se a partir desse momento meu relato vai ser muito fiel porque eu literalmente pirei com a anestesia. Não sei bem o que aconteceu, mas fiquei muito tonta, me sentindo muito mal e pior, a dor não tinha passado, ainda sentia fortemente as contrações! Nessa hora um clima tenso se instalou na LDR, obviamente quem me contou isso foi o Dr. Marcos, pois eu era incapaz de perceber qualquer coisa, estava totalmente descompensada. Chegaram a desconfiar de uma possível ruptura uterina. Logo esse clima tenso se transformou em euforia.
O Dr. Marcos, desconfiado da minha reação à anestesia resolveu fazer outro exame, e surpreendentemente a minha dilatação era total e o Pedro estava nascendo!!! Foi uma correria só, eu não entendia bem o que estava acontecendo, o Ricardo gritava “O Pedro vai nascer, eu tô vendo a cabeça dele, é super cabeludo”. Nessa hora qualquer mal estar desapareceu, eu pensei “Eu consegui, vou ter o meu parto normal tão esperado”!! Ninguém acreditava no que estava acontecendo, era um tal de pega equipamento daqui, pega o berço dali, uma loucura!
O Dr. Marcos colocou o espelho na minha frente e eu pude tocar a cabeçinha do meu filho ainda dentro de mim, esse foi nosso primeiro contato. O Dr. Marcos falava para eu segurar, não fazer força, caso contrário o Pedro nasceria nas mãos do anestesista. Foi incrível, a dilatação evoluiu de seis para dez centímetros em menos de quinze minutos, o bebê desceu muito rápido. Essa foi a explicação para a minha reação à anestesia, foi a dor da descida do bebê que me descompensou, afinal não havia dado tempo da anestesia pegar direito. Ah, esqueci de contar que logo que tomei à anestesia a bolsa se rompeu naturalmente, o que acho eu que facilitou a descida do bebê.
Eu não me agüentava de tanta emoção, parecia que não era real, foi tudo tão rápido, não deu tempo de raciocinar, eu fui do desânimo à euforia em poucos minutos, estava difícil de acreditar que logo estaria com meu Pedro nos braços!
Exatamente a 00:15 hs do dia 27 de dezembro, senti o meu filho saindo de dentro de mim, impossível descrever nesse relato aquele momento, muitos sentimentos se confundiram, eu finalmente havia conseguido, agora sim eu me sentia a pessoa mais poderosa do mundo! O Pedro nasceu super bem, com 3.655 Kg, apgar 9 e 10. O Ricardo cortou o cordão umbilical e para meu delírio meu filho veio diretamente aos meus braços.
Aquilo para mim foi um resgate, uma volta ao passado, nada, absolutamente nada se compara ao que eu senti naquela hora. Finalmente eu poderia dar ao meu filho todo meu amor. O primeiro toque, o primeiro cheiro, a primeira palavra, tudo isso eu pude dar ao meu filho. Ele mamou com menos de uma hora de vida.
Naquela hora eu descobri a força da natureza, meu instinto materno se encontrava plenamente realizado, minha família estava completa e mais feliz do que nunca!!!!